Por
meio de implantes no cérebro, animais passaram a ser capazes de sentir a luz
infravermelha, habilidade inédita em mamíferos.
Pela primeira vez na
história, um mamífero ganhou um sexto sentido artificial, a capacidade de
"enxergar" a luz infravermelha, para se somar aos outros cinco dados
pela natureza - audição, olfato, paladar, tato e visão. A proeza foi realizada
pela equipe do brasileiro Miguel Nicolelis no Centro de Neuroengenharia da
Universidade Duke, em Durham, na Carolina do Norte (Estados Unidos), e foi publicada
nesta terça-feira na revista Nature Communications.
Nenhum mamífero consegue enxergar a luz
infravermelha — seus olhos são incapazes de captar ondas de luz com comprimento
de onda tão grande. Algumas cobras são capazes de detectar a radiação
infravermelha por meio de um órgão localizado entre suas narinas e olhos,
chamado fosseta loreal. A visão infravermelha também foi descoberta entre
alguns insetos, como os besouros. Para dar aos ratos essa nova habilidade, a
equipe de Nicolelis instalou um detector de luz infravermelha na cabeça do
animal, e ligou o aparelho a um eletrodo implantado no cérebro do rato.
Assim, a equipe foi além de todas as pesquisas
anteriores, que se baseavam no uso de implantes cerebrais apenas para restaurar
funções corporais perdidas, como controlar braços e pernas mecânicos. Nesta
pesquisa, pela primeira vez, eles conseguiram aumentar a percepção natural de
um animal. "Este é o primeiro trabalho em que um dispositivo neuroprotético
foi usado para aumentar uma função, literalmente permitindo que um animal
normal adquirisse um sexto sentido”, diz Eric Thomson, principal autor do
estudo.
Embora o experimento tenha testado apenas se
ratos podiam detectar luz infravermelha, os pesquisadores dizem que o mesmo
método poderá ser usado no futuro para dar aos animais — ou seres humanos — a
capacidade de ver em qualquer região do espectro eletromagnético.
"Poderíamos criar dispositivos sensíveis a qualquer energia física.
Poderiam ser campos
magnéticos, ondas de rádio ou ultrassom.
Escolhemos infravermelho inicialmente porque ele não interfere com os nossos
registros eletrofisiológicos", diz Miguel Nicolelis.
No fio do bigode — Os
pesquisadores usaram seis ratos em seus experimentos. Inicialmente, eles foram
colocados dentro de uma câmara circular, que continha três pequenos
compartimentos com luzes que se acendiam em ordem aleatória. Quando piscavam,
as luzes indicavam onde o animal poderia encontrar uma fonte de água e matar
sua sede. No começo, foram usadas luzes visíveis — até que os ratos estivessem
habituados ao método.
Terminado o treinamento dos animais, os
pesquisadores implantaram microeletrodos em seus cérebros, capazes tanto de
registrar a atividade elétrica dos neurônios quanto de estimular o tecido com
pequenas correntes. Cada um desses microeletrodos media cerca de um décimo do
diâmetro de um fio de cabelo. Os dispositivos foram implantados em uma região
cerebral conhecida como córtex somestésico, responsável por processar as
informações tácteis geradas pelos bigodes dos roedores.
Os pesquisadores também instalaram um detector
infravermelho na cabeça de cada animal e o conectaram ao microeletrodo em seu
cérebro. O sistema foi programado para que, cada vez que o detector
identificasse uma fonte de luz infravermelha, o dispositivo gerasse pulsos
elétricos no córtex somestésico dos ratos. A frequência dos pulsos aumentava
conforme o animal se aproximasse da fonte de luz infravermelha.
Os ratos foram devolvidos à câmara de teste, e os cientistas substituíram gradualmente as luzes usadas. No início, quando a luz infravermelha era ligada, os animais começavam a procurar aleatoriamente os locais de recompensa e passavam a acariciar os próprios rostos, como se estivessem recebendo um estímulo táctil prazeroso. Segundo os pesquisadores, isso acontecia porque eles interpretavam os sinais elétricos como se fossem provenientes dos seus bigodes.
Os ratos foram devolvidos à câmara de teste, e os cientistas substituíram gradualmente as luzes usadas. No início, quando a luz infravermelha era ligada, os animais começavam a procurar aleatoriamente os locais de recompensa e passavam a acariciar os próprios rostos, como se estivessem recebendo um estímulo táctil prazeroso. Segundo os pesquisadores, isso acontecia porque eles interpretavam os sinais elétricos como se fossem provenientes dos seus bigodes.
No entanto, com o passar do tempo, os seis
animais aprenderam a associar o sinal de cérebro com a luz infravermelha.
Depois de cerca de um mês, eles já estavam procurando ativamente o sinal
infravermelho, atingindo uma pontuação quase perfeita na identificação da fonte
de luz correta. Eles haviam se acostumado ao novo sentido, e já o usavam para
se guiar pelo mundo.
Plasticidade cerebral — Segundo
os cientistas, o experimento demonstrou, pela primeira vez, que uma nova fonte
de informação sensorial pode ser processada em uma região cerebral
especializada em outro sentido. E, mais importante, sem afetar a função original
desta área do cérebro. "Quando gravamos sinais do córtex somestésico
desses animais, descobrimos que, embora as células tivessem começado a
responder à luz infravermelha, elas continuavam a reagir à estimulação táctil
dos bigodes. Era quase como se o córtex estivesse se dividido uniformemente, de
modo que os neurônios pudessem processar ambos os tipos de informações”, diz
Nicolelis.
Os pesquisadores batizaram de plasticidade cerebral essa capacidade que certas regiões do cérebro têm de assumir funções nas quais elas não são originalmente especializadas. Essa ideia vai contra uma visão mais clássica do funcionamento do órgão — chamada de optogenética — que defende que um tipo específico de célula neuronal deve ser estimulado para gerar a função neurológica desejada. Em vez disso, a experiência demonstra que a estimulação elétrica ampla, que recruta tipos diferentes de células, pode levar uma região cortical a se adaptar à nova fonte de estímulos sensoriais. "No futuro isso pode ajudar pacientes que perderam a visão por causa de uma lesão no córtex visual. Até hoje, não havia o que fazer com relação a isso. Com nossa descoberta, mostramos que podemos usar o córtex táctil para devolver graus de visão para esses pacientes. E isso é só o começo", afirmou Nicolelis em entrevista ao site de VEJA.
Os pesquisadores batizaram de plasticidade cerebral essa capacidade que certas regiões do cérebro têm de assumir funções nas quais elas não são originalmente especializadas. Essa ideia vai contra uma visão mais clássica do funcionamento do órgão — chamada de optogenética — que defende que um tipo específico de célula neuronal deve ser estimulado para gerar a função neurológica desejada. Em vez disso, a experiência demonstra que a estimulação elétrica ampla, que recruta tipos diferentes de células, pode levar uma região cortical a se adaptar à nova fonte de estímulos sensoriais. "No futuro isso pode ajudar pacientes que perderam a visão por causa de uma lesão no córtex visual. Até hoje, não havia o que fazer com relação a isso. Com nossa descoberta, mostramos que podemos usar o córtex táctil para devolver graus de visão para esses pacientes. E isso é só o começo", afirmou Nicolelis em entrevista ao site de VEJA.
Link para o vídeo do experimento:
http://www.youtube.com/watch?v=nsniwzap2qE&feature=player_embedded
Fonte: Revista Veja on line fev/2013
http://veja.abril.com.br/noticia/ciencia
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