Uma comissão
do CFM (Conselho Federal de Medicina) estuda autorizar as clínicas de
reprodução a descartar embriões congelados há cinco anos ou mais, com a
permissão dos pais.
A medida
ainda precisa ser aprovada em plenária. Hoje, o conselho permite a doação de
embriões para pesquisa ou para outro casal.
Fora dessas
situações, o casal é obrigado a manter os embriões congelados nas clínicas. E a
pagar uma taxa inicial, que varia entre R$ 800 e R$ 1.500, e uma mensalidade de
R$ 50, em média.
"Muitas
pessoas não querem doar. Querem descartar simplesmente", diz o médico
Eduardo Motta, da clínica Huntington, em São Paulo.
Um dos
membros da comissão do CFM, o médico José Gonçalves Franco Júnior, do CRH
(Centro de Reprodução Humana), de Ribeirão Preto (SP), entende que o casal
tenha o direito de decidir pelo descarte. "Não é uma decisão do Estado, da
igreja ou dos médicos."
Para ele, a
própria Lei de Biossegurança, de 2005, já abriu um precedente para o descarte
quando autorizou o uso de embriões em pesquisas. "Ali, ficou decidido que
o embrião não é uma vida."
O médico
Edson Borges Júnior, da clínica Fertility, lembra que o descarte de embriões é
um procedimento frequente nas clínicas.
"Os
embriões classificados como inviáveis são descartados. Mas sabemos que essa
classificação está longe de ser perfeita. Todos nós temos casais em que foram
transferidos embriões 'feios' e que nasceram bebês 'lindos'."
ABANDONADOS
Uma outra
questão que deverá ser discutida pelo CFM é o destino dos embriões congelados
que foram abandonados pelos pais.
Geralmente,
são situações em que casal engravidou com o tratamento, teve sobra de embriões
e os congelou para uma outra eventual gravidez, mas acabou
"abandonando-os" nas clínicas por diversas razões (morte de um dos
cônjuges, separação ou mudança de cidade ou país).
Estima-se
que 10% a 20% dos 60 mil embriões congelados no país (segundo dados da Anvisa,
Agência Nacional de Vigilância Sanitária) estejam nessa condição.
Países como a Inglaterra e a Espanha autorizam o descarte dos abandonados.
Países como a Inglaterra e a Espanha autorizam o descarte dos abandonados.
No CRH, de
Ribeirão, há dois embriões que completam 22 anos em 2013. Existem outros 1.541
congelados entre 1992 e 1999. "Perdemos o contato com a maioria desses
casais", diz Franco Júnior.
Na clínica
Huntington, a situação é semelhante. São 918 embriões abandonados dentro de um
universo de 9.451 congelados. "Não sabemos bem o que fazer, mas que temos
que mantê-los, arcando com as despesas de tanque e nitrogênio líquido, além do
pessoal especializado."
Na
Fertility, há cerca de 2.200 embriões congelados, dos quais 185 são
"órfãos". "Perdemos completamente o contato com o casal",
diz Borges Júnior. "Temos que ter mais coragem para abordar diretamente
esse tema."
Para
Reinaldo Ayer de Oliveira, professor de bioética da USP e conselheiro do
Cremesp, o destino dos embriões abandonados deve ser uma questão discutida por
toda a sociedade brasileira.
"É
preciso criar uma legislação específica para esses casos. É um problema
nacional, enfrentado por clínicas de todos os Estados."
Embrião congelado faz irmãos gêmeos terem nove anos de diferença
Os trigêmeos Augusto, Gustavo e Vitória, 10, e o caçula, Vitório, de um ano, em Bauru, no interior de SP |
"Este é
o nosso irmão quadrigêmeo". É dessa forma que os trigêmeos Vitória,
Augusto e Gustavo costumam apresentar o irmão caçula, Vitório.
Não é
brincadeira de criança. Os trigêmeos fazem aniversário no dia 19 de março.
Vitório também. Os três são frutos de uma fertilização in vitro feita pelos
pais em 2001. Vitório também. A diferença é que o trio nasceu em 2002 e
Vitório, em 2011, após ficar quase uma década congelado quando era apenas um
embrião.
"Nós
passávamos horas olhando para ele dormindo, vendo se estava tudo ali inteiro.
Parecia alucinante que aquela criança tivesse ficado tanto tempo
congelada", conta a mãe, Márcia Renata Carvalho, 42, de Bauru (SP).
Márcia fez o
tratamento de reprodução em 2001, após sete anos de tentativas de gravidez. Ela
tinha endometriose, e o marido, Segundo Carvalho, 48, baixa contagem de
esperma.
Três embriões foram transferidos para o útero
de Márcia (e resultaram nos trigêmeos) e outros três foram congelados.
"Desde
que soube que estava grávida de trigêmeos, nunca mais parei de pensar nos
embriões que ficaram congelados. Jamais pensei em doá-los para pesquisa ou para
outro casal ou em descartá-los. Sabia que na hora certa iria buscá-los. Eram
meus."
E a hora foi
em 2010. No processo de descongelamento, apenas um embrião sobreviveu e se
fixou ao útero. O tratamento aconteceu em Ribeirão.
"As
crianças vibraram muito com a gravidez. A Vitória dormia abraçada à minha
barriga. Quando soubemos que era menino, eu disse: o irmão de vocês é um
vitorioso, um valente. Então, vocês já podem escolher o nome: ou é Vitório ou é
Valentino."
Mimo é o que
não falta ao pequeno. "O 'congeladinho' é mais bonito!'", costumam
dizer à mãe.
Fonte: Folha de São Paulo – on line 27/01/2013
Por: CLÁUDIA COLLUCCI
Imagem: Avener Prado/Folhapress
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