Crianças pequenas que tomaram bebidas açucaradas diariamente eram mais gordas aos 5 anos. |
É sabido que refrigerantes,
bebidas energéticas, e outros refrescos açucarados contribuem para o problema
da obesidade dos americanos. Essa associação levou alguns formuladores de
políticas a enfrentar o problema restringindo o acesso aos produtos ou as doses
servidas.
Isso inclui o esforço
do conselho de saúde de Nova York de proibir restaurantes, delicatessens,
cinemas, carrinhos de lanches e estádios de venderem bebidas adoçadas em copos
de mais de 0,473 litro.
Agora, menos de uma
semana depois de um tribunal de apelação ter vetado a proibição proposta (a
decisão foi tomada em 30 de julho), um estudo na revista Pediatrics encontrou
evidências de que o link entre bebida açucarada e obesidade ocorre na população
mais jovem a ser estudada nessa dimensão: crianças bem pequenas e em idade
pré-escolar.
Acompanhando 9.600
crianças desde o nascimento até os cinco anos de idade, os pesquisadores
identificaram um padrão de consumo de bebidas açucaradas em crianças a partir
dos dois anos, o que preparou o terreno para que engordassem excessivamente
alguns anos depois.
As bebidas estudadas
incluem refrigerantes, bebidas energéticas esportivas, outras bebidas com
adição de açúcar, refrescos e sucos que não eram 100% puros.
A envergadura do estudo
e o longo período de acompanhamento tornaram suas conclusões particularmente
valiosas para médicos como Dyan Hes, diretor da clínica Gramercy Pediatrics em
Manhattan, que tem feito um lobby a favor de políticas públicas, como impostos
sobre refrigerantes, que tornariam essas bebidas menos atraentes para as
famílias.
“O estudo é fantástico,
porque precisamos de mais provas”, diz Hes. “Sabemos que as bebidas açucaradas
são as maiores contribuintes para o aumento da obesidade em crianças, porque
elas são baratas. Isso mostra que ao dar bebidas adoçadas a seus filhos aos
dois anos de idade, você está criando hábitos que são muito difíceis de
abandonar”.
O estudo não constatou
que crianças de dois anos que tomavam pelo menos uma bebida açucarada por dia
ganhavam peso de imediato em comparação com seus coleguinhas que não as bebiam;
mas as crianças que consumiram bebidas açucaradas diariamente eram mais gordas
aos cinco anos.
De fato, elas se
revelaram 1,43 vezes mais propensas à obesidade que crianças em idade
pré-escolar que não consumiam bebidas açucaradas diariamente, inclusive depois
de considerar outros fatores que poderiam influenciar o ganho de peso.
Mark DeBoer, professor
assistente de pediatria da University of Virginia, diz que os resultados
sustentam a hipótese de que o consumo regular de bebidas adoçadas com açúcar
tem um efeito cumulativo de longo prazo. “Ficamos impressionados com os dados
que mostraram que mesmo em uma idade muito jovem, as bebidas açucaradas
contribuem para o ganho de peso”, comenta DeBoer, “e queríamos disponibilizar
essas informações aos pediatras e às famílias para ajudá-los a fazerem escolhas
mais saudáveis para seus filhos”.
BEBIDAS AÇUCARADAS VERSUS ESTILOS DE VIDA
PREJUDICIAIS
As entrevistas também
revelaram um padrão que se repetiu em outros estudos: que o consumo de bebidas
açucaradas está correlacionado a fatores adicionais, já ligados à obesidade.
Entre as crianças que
bebiam pelo menos uma porção de bebida doce por dia, uma proporção maior tinha
mães com sobrepeso ou obesas; e uma proporção maior também assistia pelo menos
duas horas de televisão por dia em comparação às crianças que consumiam esses
refrescos com menor frequência.
Além disso, um número
maior de consumidores de refrescos açucarados eram negros, hispânicos ou
procedentes de famílias de baixa renda.
Todos esses fatores
demonstraram comprovadamente que as bebidas desempenham um papel (relevante) no
ganho de peso incomum entre crianças. Os ajustes para essas variáveis nesse
estudo, porém não conseguiram eliminar a ligação entre bebidas açucaradas e
obesidade aos cinco anos.
Ainda assim, Yoni
Freedhoff, especialista em obesidade e professor assistente de medicina familiar
na University of Ottawa, argumenta que estudos como esse também deveriam
controlar a frequência com que as famílias comem fora; a regularidade com que
todos comem juntos; os horários das refeições e dos lanches; os tipos de
refeições que consomem, se “pulam” o café da manhã; e quanto suco ou leite
achocolatado bebem.
“Talvez as bebidas
adoçadas com açúcar sejam um marcador para outros problemas alimentares e
preocupações”, pondera Freedhoff, embora concorde que as bebidas adoçadas
contribuam para um ganho de peso prejudicial.
A equipe de DeBoer tem
alguns desses dados adicionais, mas é difícil abordar estatisticamente muitos
fatores ao mesmo tempo em uma população de quase 10 mil crianças.
Em contrapartida,
Walter Willet, epidemiólogo nutricional na Harvard School of Public Health,
concorda que controles rígidos dos fatores de estilo de vida são importantes,
mas endossa a análise feita nesse estudo.
“O nível
socioeconômico, o IMC [índice de massa corporal] dos pais e a frequência
televisiva estão fortemente correlacionados a outros indicadores de estilo de
vida, que são potenciais fatores de confusão”, diz Willett.
“Isso quer dizer que
eles controlaram outras variáveis indiretamente, pelo menos em parte”. Além
disso, algumas das descobertas anteriores que vinculam bebidas açucaradas e
obesidade em crianças mais velhas e adultos incluem ensaios clínicos
aleatórios. Sendo assim, dada a biologia subjacente semelhante para ganho de
peso entre diferentes grupos etários, os resultados de DeBoer provavelmente são
válidos, diz ele.
MAIS
CALORIAS, MENOS SENSAÇÃO DE PLENITUDE
Há um consenso geral
sobre o porquê as bebidas adoçadas com açúcar são tão relevantes no ganho de
peso.
As calorias de bebidas
tipicamente não saciam. “Se você beber 110
calorias com sua refeição, não comerá 110 calorias menos de alimentos”, explica
Freedhoff. “Deveríamos reduzir o consumo de calorias líquidas de todas as
fontes, independente da nossa idade. Não estou ciente de qualquer bebida cujos
benefícios de saúde não possam ser obtidos de sólidos muito mais saciantes”.
De fato, diversos
estudos anteriores constataram que crianças que ingerem regularmente bebidas
adoçadas com açúcar têm uma ingestão calórica total diária de 17 a 20% maior.
Embora um editorial que
acompanhou o estudo de DeBoer tenha sugerido o leite como bebida alternativa
(que pode saciar mais e, talvez, substituir algumas calorias alimentares),
tanto o estudo de DeBoer como o de Willett concluíram que o leite desnatado e o
semidesnatado, com 1% de gordura, estão ligados ao ganho nocivo de peso em
crianças.
Ainda não há uma
avaliação conclusiva quanto ao leite integral. “Eu adoraria ver alguns estudos
sobre as calorias líquidas como um todo, em vez de tentar analisar
detalhadamente ou demonizar uma bebida em particular”, declara Freedhoff.
No entanto, ele lamenta
que a lei de Nova York não tenha sido aprovada, porque ela poderia ter ajudado
a tornar os consumidores mais conscientes de suas escolhas.
De acordo com Hes, a
rejeição da lei provavelmente resultou de problemas logísticos com sua
execução.
“Em grande escala ela
simplesmente era uma regra muito complicada de implementar”, diz ele. “Acredito
que é muito melhor criar um imposto, como é feito com os cigarros. Se as
bebidas adoçadas com açúcar tiverem um imposto adicional, as pessoas comprarão
menos. (Atualmente) Elas são muito acessíveis”.
Independentemente do
que será feito, Freedhoff acredita que as bebidas com calorias adicionais podem
ser um bom ponto de partida. “Dada à facilidade com que as calorias líquidas
podem ser cortadas da nossa dieta, elas são um primeiro alvo muito real e óbvio
se estamos falando de obesidade e peso”, diz ele.
Fonte:
SCIENTIFIC AMERICAN BRASIL
Por:
Tara Haelle
Imagem:
AnneMS/Shutterstock
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