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quinta-feira, 29 de agosto de 2013

Matemáticos defendem intervenções randômicas contra surtos de doenças: Publicação recente mostra eficácia de tratamentos com intervalos variados


A aleatoriedade nos cronogramas de tratamento pode ajudar a controlar um surto de doença. 
Docent/Shutterstock

É grande o esforço de fazer com as pessoas se vacinem contra a gripe nas últimas semanas de verão: o trabalho, a escola, os horários limitados de funcionamento das farmácias, os dias de praia e inúmeros outros fatores conspiram para interferir.

Consequentemente, as vacinações tendem a se arrastar por muitos meses. Em vez de resistirem à tendência, alguns matemáticos acreditam que as autoridades da saúde pública algum dia poderão até adotá-la. Um pouco de aleatoriedade em cronogramas de tratamentos de fato podem até ajudar a controlar um surto de doença.

A conclusão resulta de uma análise das opções de tratamento em surtos de doenças infecciosas usando a teoria da complexidade, que tenta conferir sentido a sistemas fundamentalmente imprevisíveis.

Empregando a teoria da complexidade para estudar epidemias, pesquisadores identificaram situações raras em que elas desaparecem de repente.

Digamos, por exemplo, que agentes da saúde ministrem antibióticos para combater um surto de meningite bacteriana fazendo com que as infecções diminuam. Um modelo clássico da doença indicaria que toda pessoa infectada deve ser isolada e tratada antes que a doença seja controlada.

A teoria da complexidade, no entanto, mostra que, ocasionalmente, ela desaparecerá devido a fatores aleatórios e imprevisíveis.

É impossível prever um “evento randômico de extinção” desse tipo, mas uma nova pesquisa mostra que o timing criterioso de tratamentos preventivos pode aumentar as chances de que isso ocorra.

Saber como variar esses períodos para tornar os eventos de extinção mais prováveis poderia ser extremamente útil em países em desenvolvimento, onde os suprimentos de produtos farmacêuticos muitas vezes são limitados e os tratamentos não estão disponíveis durante o ano todo, mas são ministrados em determinadas épocas do ano.

Esse frequentemente é o caso quando uma organização de ajuda humanitária gerencia os tratamentos à distância.

Ira Schwartz, um matemático aplicado e físico do Laboratório de Pesquisa Naval dos Estados Unidos e colaboradores fizeram uma simulação computadorizada para modelar o comportamento geral de doenças infecciosas em uma população de oito mil pessoas. A simulação levou em conta o elemento da aleatoriedade e comparou o resultado de dois cenários distintos: um em que o tratamento foi fornecido a intervalos regulares e outro em que os intervalos eram irregulares (randômicos).

Eles compararam os dois cenários para doenças infecciosas como a meningite bacteriana, doenças venéreas e a peste, que são tratadas em grande parte com antibióticos.

Os resultados mostraram que nos casos em que o tratamento só pode ser ministrado em fases de duas a oito vezes por ano, o cronograma aleatório resultou em uma redução exponencial do tempo para que ocorresse um evento de extinção randômico; ou seja, uma doença desapareceu mais rapidamente. “A pesquisa demonstra por que cronogramas de tratamento irregulares funcionam”, diz Schwartz, coautor do artigo publicado na revista PLoS ONE, em agosto.

Em 2008, Schwartz foi coautor de outro artigo que utilizou modelos semelhantes para testar o efeito da vacinação aleatória em membros novos da população (crianças) e mostrou decréscimos semelhantes no tempo de extinção de doenças.

Na nova publicação os pesquisadores especulam que, se os tratamentos de doenças são ministrados duas vezes por ano, com um intervalo de seis meses, a doença pode ter tempo para recuperar sua força entre as doses.

Em um cronograma randômico, no entanto, essas doses podem ser ministradas mais perto uma da outra aumentando a probabilidade de que a segunda aplicação atacará a doença enquanto ela está enfraquecida.

Essa combinação particularmente eficaz de duas “investidas” seguidas aumenta a possibilidade da ocorrência de um evento de extinção randômico. (Embora os pesquisadores possam calcular as probabilidades de um evento desses, em última instância eles continuam imprevisíveis.)

Por essa razão, os pesquisadores concluem que quando os recursos são limitados, o tratamento deve ser ministrado a uma porcentagem maior da população em algumas poucas etapas randômicas, porém próximas umas das outras, em vez de em muitas fases menores que atendem menos pessoas.

Com mais pesquisas sobre a interação randômica entre tratamento e doença é possível que os cientistas façam mais sugestões de como melhor ministrar os tratamentos, particularmente em lugares onde os suprimentos e os recursos humanos são limitados.

Charles Doering, diretor interino do Centro para o Estudo de Sistemas Complexos da University of Michigan, diz que a equipe de Schwartz é uma das poucas que estuda como a aleatoriedade em cronogramas de tratamento pode afetar a evolução de uma doença infecciosa.

Embora os pesquisadores tenham utilizado modelos bem estabelecidos de como as doenças se propagam e sobrevivem em populações humanas, suas técnicas matemáticas para levar em conta a aleatoriedade, desenvolvidas a partir de mecânica quântica, são difíceis de serem aplicadas em modelos de doenças. “Nunca se sabe ao certo”, diz ele. “Se você alterasse qualquer parte da estrutura do modelo, talvez as conclusões mudassem”.

No entanto, o trabalho pode inspirar outros estudos com simulações computadorizadas mais abrangentes ou experimentos laboratoriais que testem essas teorias em populações de micro-organismos vivos. “Isso constitui um ponto de partida; uma hipótese de trabalho para se investigar”, acrescenta.

Fonte: Scientific American Brasil
Por: Calla Cofield


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