Durante o
surto de psicose, cérebro apresenta padrão de atividade elétrica semelhante ao
observado nos sonhos
Imagem feita
por microscópio eletrônico do hipocampo do cérebro humano
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Pesquisadores
brasileiros começam a identificar alterações no funcionamento do cérebro que
podem estar na origem dos delírios e das alucinações que caracterizam os surtos
de psicose, comuns em transtornos mentais como a esquizofrenia. Em experimentos
realizados com ratos, o grupo coordenado pelo neurocientista Adriano Tort da
Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) verificou que a atividade
elétrica cerebral durante os surtos psicóticos é semelhante à observada no
chamado sono REM, a fase em que ocorrem os sonhos. “Esse resultado nos leva a
suspeitar de que os surtos psicóticos tenham alguma relação com os eventos
oníricos”, conta o biólogo Fábio Viegas Caixeta, integrante da equipe de Tort
no Instituto do Cérebro da UFRN e primeiro autor desse trabalho, publicado na edição de 2 de agosto da revista
Scientific Reports.
Quando se
está acordado, o cérebro é tomado por correntes elétricas que oscilam
rapidamente, entre 10 e 100 vezes por segundo. Durante o sono REM, esses pulsos
elétricos de alta frequência dão lugar a outros mais lentos – são as chamadas
ondas teta –, que se repetem entre 5 e 10 vezes por segundo e intensificam
pulsos ultrarrápidos, com frequência de 110 a 160 vezes por segundo. Os
pesquisadores da UFRN registraram essa mesma combinação de pulsos lentos e
ultrarrápidos no hipocampo de um grupo de ratos tratados com cetamina, um
anestésico que em doses baixas causam nos seres humanos delírios e alucinações
idênticos aos da psicose.
A observação
de padrão elétrico incomum no estado de vigília pode indicar o funcionamento
inadequado do hipocampo, região profunda do cérebro associada ao aprendizado, à
memória, à tomada de decisão e à integração da informação captada por
diferentes órgãos do sentido. Se for confirmado por outros estudos, esse achado
corrobora uma antiga suspeita da medicina: a de que há algo de errado com o
hipocampo na esquizofrenia. “Falhas na integração das informações sensoriais
são uma origem provável dos delírios e das alucinações”, diz Caixeta.
Caso os
registros da atividade elétrica do cérebro forneçam, de fato, uma boa
representação do funcionamento desse órgão complexo e pouco conhecido, os
resultados da Scientific Reports podem reforçar também uma ideia
proposta há algumas décadas pela psicanálise e pela psicologia: haveria uma
causa comum à falta de coerência lógica entre as ideias apresentadas nos sonhos
e à confusão mental característica dos delírios e à convicção nos eventos
irreais típica da alucinação. Dito de forma simples: passar por um surto
psicótico seria semelhante a sonhar acordado.
“Os
resultados desse trabalho nos aproximam de compreender os mecanismos biológicos
associados aos episódios de psicose, característicos de transtornos mentais
como a esquizofrenia”, explica Tort. “Esse conhecimento é fundamental para que
se possam desenvolver tratamentos capazes de atuar sobre a origem do problema e
não apenas sobre seus sintomas”, afirma o pesquisador. Anos atrás, quando ainda
era pesquisador do Instituto Internacional de Neurociências de Natal Edmond
& Lily Safra, Tort já havia demonstrado a influência das ondas teta sobre a
intensidade dos pulsos mais rápidos (ondas gama) em duas atividades
fundamentais do hipocampo: a recordação de uma memória e a tomada de decisão.
Artigo
científico
CAIXETA, F.V. et al. Ketamine alters oscillatory coupling in the hippocampus. Scientific Reports. 2 ago. 2013.
CAIXETA, F.V. et al. Ketamine alters oscillatory coupling in the hippocampus. Scientific Reports. 2 ago. 2013.
FONTE: REVISTA FAPESP
RICARDO ZORZETTO | Edição Online agosto de 2013
IMAGEM: ©
METHOXYROXY / WIKIMEDIA
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