Pesquisadores querem criar um ambiente adequado para a produção de células-tronco hematopoiéticas, precursoras de todos os tipos de células sanguíneas
Um grupo internacional de pesquisadores, entre eles o biomédico brasileiro Alexander Birbrair, do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), deu um passo importante na tentativa de criar em laboratório um ambiente adequado para o cultivo das chamadas células-tronco hematopoiéticas, precursoras de todos os tipos de células sanguíneas, como hemácias, granulócitos, linfócitos e plaquetas. Em um estudo publicado na edição de março da revista Nature Cell Biology, o grupo analisou o microambiente que abriga esse tipo de célula dentro da medula óssea, um tecido líquido que ocupa a cavidade dos ossos, e identificaram células e sinais químicos responsáveis por sua manutenção.
Há algum tempo se sabe que essas células-tronco se formam durante o desenvolvimento do feto, sobretudo no fígado e no baço. Após o parto, no entanto, elas migram para a medula óssea, onde permanecem em número reduzido. Algumas ficam dormentes e só são ativadas quando precisam formar células novas iguais a elas. Outras são acionadas em casos de emergência e se diferenciam em células mais maduras, como macrófagos e linfócitos.
No estudo publicado na Nature Cell Biology, os pesquisadores verificaram que as células hematopoiéticas inativas estão situadas em uma região da medula óssea próxima a minúsculos vasos sanguíneos chamados arteríolas, e que nas paredes desses vasos estão os pericitos arteriolares, um tipo de célula-tronco mesenquimal com potencial para se diferenciar e formar os tecidos gordurosos, ossos ou músculos.
Ao analisá-los em detalhe, os pesquisadores constataram que os pericitos produzem uma citocina — molécula responsável pela comunicação entre células — chamada CXCL12. Para melhor investigar sua função, desenvolveram testes com camundongos com uma alteração genética que impedia que seus pericitos produzissem a CXCL12. Verificaram que, nesse caso, as células-tronco hematopoiéticas desapareciam, e as poucas que sobraram perdiam a capacidade de se especializar em células do sangue. “Os resultados sugerem que os pericitos, por meio da produção da CXCL12, são importantes na manutenção das células hematopoiéticas dentro da medula óssea”, diz Birbrair.
As células-tronco hematopoiéticas são importantes no tratamento da leucemia, um tipo de câncer que acomete os glóbulos brancos. “Em muitos casos, no entanto, o transplante dessas células não é suficiente para restabelecer a função medular e imune do indivíduo, de modo que muitos precisam de um segundo transplante de medula”, explica Birbrair. O problema é que é difícil encontrar doadores compatíveis e a quantidade de células disponíveis na medula tende a ser pequena. Outro complicador é que, diferentemente de outras células-tronco, as hematopoiéticas ainda não são obtidas por multiplicação in vitro porque, quando reproduzidas artificialmente, perdem a capacidade de se diferenciar em células sanguíneas.
Para Birbrair, os resultados do estudo ampliam as perspectivas de se criar um ambiente adequado para a produção dessas células. “A possibilidade de cultivar células-tronco hematopoiéticas em ambiente artificial pode levar à criação de bancos dessa célula, o que facilitaria o tratamento de pacientes com leucemia”, destaca. “Precisamos antes compreender como elas funcionam em seu microambiente dentro dos ossos.” A partir dos resultados obtidos, o grupo pretende iniciar os primeiros estudos para mimetizar o microambiente da medula óssea e tentar multiplicar essas células-tronco em laboratório.
Artigo científico
ASADA, N .et al. Differential cytokine contributions of perivascular haematopoietic stem cell niches. Nature Cell Biology. v. 19, n. 3, p. 214–23. mar. 2017.
Fonte: Revista Fapesp on line 18:01
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