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segunda-feira, 21 de novembro de 2016

Pesquisadores identificam novas estratégias de invasão do Trypanosoma cruzi

Descobertas abrem caminho para o desenvolvimento de substâncias capazes de interferir no ciclo de vida do parasita ainda na fase inicial da infecção


 © BONFIM-MELO ET AL., 2015.
Imagem obtida por microscopia confocal mostra recrutamento de moléculas de células hospedeira pelo Trypanosoma cruzi. A cortactina da célula HeLa (vermelho) e a proteína quinase D1-GFP (verde) são recrutadas, formando uma espécie de taça que envolve o parasita, trazendo-o para dentro da célula (azul)
Imagem obtida por microscopia confocal mostra recrutamento de moléculas de células hospedeira pelo Trypanosoma cruzi (pontos brancos). A cortactina da célula HeLa (vermelho) e a proteína quinase D1-GFP (verde) são recrutadas, formando, juntamente com a actina (azul), uma espécie de taça (rosa) que envolve o parasita, trazendo-o para dentro da célula.

Inoculado no organismo pela picada do barbeiro, um inseto de hábitos noturnos que se alimenta de sangue, o protozoário Trypanosoma cruzi influencia o funcionamento das células humanas antes mesmo de as invadir. Ao chegar aos tecidos pelos quais tem afinidade, o parasita libera no meio extracelular uma molécula, a enzima mevalonato quinase (MVK), que facilita a sua entrada nas células. A MVK é mais conhecida por participar da síntese de colesterol em diversos organismos. Mas, secretada pelo T. cruzi, ela ganha uma nova função. Em contato com as células hospedeiras, ela ativa uma cascata de reações químicas que ajudam o parasita a invadir a célula e dar início à infecção que caracteriza a doença de Chagas, enfermidade que afeta aproximadamente 7 milhões de pessoas no mundo, sobretudo na América Latina.
Uma equipe de pesquisadores da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) identificou recentemente essa ação extracelular do protozoário e a descreveu em um artigo publicado na revista Scientific Reports. Segundo os pesquisadores, os achados abrem caminho para o desenvolvimento de estratégias capazes de interferir no ciclo de vida do T. cruzi em uma fase bem inicial da infecção. “Até onde se sabe, o T. cruzi é o único organismo em que a MVK exerce uma segunda, e inesperada, função além de sintetizar colesterol”, diz a bióloga Diana Bahia, pesquisadora do Departamento de Microbiologia, Imunologia e Parasitologia da Unifesp e coordenadora da pesquisa. O estudo também envolveu a participação de colaboradores das universidades federais de Uberlândia (UFU) e de Minas Gerais (UFMG), do Laboratório Nacional de Biociências em Campinas (LNBio), no interior de São Paulo, e da Universidade de São Paulo (USP) de São Carlos.
Em experimentos feitos em laboratório, os pesquisadores introduziram no meio extracelular uma proteína produzida artificialmente para simular a ação da MVK. O objetivo era verificar se com mais MVK o protozoário invadiria mais facilmente as células. Eles observaram que a presença do protozoário era significativamente maior quando a enzima era secretada para o meio externo. “Concluímos que a MVK estimula outras vias de sinalização da célula hospedeira que vão culminar na facilitação da entrada do parasita na célula”, acrescenta a pesquisadora.
Em outro estudo, publicado na revista Cellular Microbiology, o grupo de Diana descreveu uma dessas vias usada pelo parasita para se estabelecer nas células dos mamíferos. Eles verificaram que proteínas quinase (PKs) adicionam fosfato em outra proteína, a cortactina. Esta, por sua vez, forma um complexo com uma proteína quinase D, a PKD. Juntas, a PKD e a cortactina auxiliam na polimerização de outra proteína, a actina, amplamente distribuída pelo interior da célula. A actina ancora-se a outras proteínas aprisionadas na membrana celular de modo a formar uma rede difusa de filamentos, o chamado citoesqueleto, responsável por manter a forma das células e suas junções e auxiliar seus movimentos. Sob a ação da PKD e da cortactina, a actina forma uma espécie de taça que envolve o parasita, trazendo-o para dentro da célula.
“Essa é a primeira vez que se descreve a participação da PKD e da cortactina como essenciais na invasão do T. cruzi na célula”, diz Diana. “Verificamos que, se eliminarmos a cortactina, a taxa de invasão diminui significativamente.” De acordo com a bióloga, essa via de sinalização ocorre paralelamente a outras já descritas — e possivelmente a muitas outras ainda desconhecidas. “Agora sabemos que, ao retirar uma dessas moléculas, podemos interferir no estabelecimento do parasita na célula. Ao intervir em uma via, é possível afetar as demais, pois elas são cruzadas”, explica. A ideia, segundo ela, é investir no estudo de moléculas que possam desativar ou inibir as moléculas envolvidas no processo de invasão pelo T. cruzi.
Projetos
1.
Biologia molecular e celular do parasitismo por Trypanosoma cruzi (nº 2011/51475-3); Modalidade Auxílio à Pesquisa — Temático; Pesquisador responsável José Franco da Silveira Filho (Unifesp); Investimento R$ 3.226.116,91 (FAPESP).
2. Identificação e caracterização molecular de proteínas quinases de Trypanosoma cruzi para o estudo da comunicação celular, modelagem molecular e desenho de drogas inibidoras: estudo dos parceiros das vias de sinalização focado na invasão de EA (nº 2007/50551-2); Modalidade Auxílio à Pesquisa — Apoio a Jovens Pesquisadores; Pesquisadora responsável Diana Bahia (Unifesp); Investimento R$ 532.546,98 (FAPESP).

 
Fonte: Revista Fapesp on line
Por Rodrigo de Oliveira Andrade

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