Proteínas que induzem o câncer podem ser transportadas das células tumorais para as saudáveis
Pesquisadores do A. C. Camargo Cancer Center, em São Paulo,
identificaram um mecanismo que pode ajudar a levar para outras células
do organismo genes e proteínas relacionados ao surgimento e à
disseminação de tumores. Em um estudo publicado na revista Proteomics, eles analisaram a proteína codificada pelo gene HER2,
que, quando produzida em excesso, pode desencadear o desenvolvimento do
câncer. Os pesquisadores verificaram que as vesículas extracelulares —
compartimentos que contêm proteínas e ácidos nucléicos — produzidas por
células mamárias em que este gene é superativo carregam uma quantidade
ainda maior do HER2 do que as próprias células que as geraram.
O gene HER2 é responsável pela produção de uma proteína
homônima, importante para o controle do crescimento, divisão e
regeneração das células. O aumento no número de cópias do HER2,
no entanto, desencadeia a superprodução dessa proteína, favorecendo a
divisão descontrolada das células, segundo os pesquisadores. Estudos têm
registrado um número considerável de cópias do gene HER2 em
até 25% dos casos de câncer de mama, levando ao desenvolvimento de uma
das formas mais agressivas da doença. Nesses casos, as células
cancerígenas tendem a crescer e a se espalhar para outras partes do
organismo de maneira mais agressiva, se não tratadas adequadamente.
No trabalho feito no A. C. Camargo Cancer Center, a equipe coordenada
pelos biólogos Emmanuel Dias-Neto e Diana Noronha Nunes analisou as
vesículas produzidas por duas linhagens de células mamárias, a HB4a e a
C5.2 — esta última uma linhagem na qual o HER2 é superativo. As
vesículas extracelulares ajudam no processo de comunicação entre as
células, transferindo o conteúdo de uma para a outra. “Quando secretadas
por células tumorais, no entanto, elas podem ajudar na disseminação de
moléculas relacionadas a diferentes aspectos da biologia do câncer”,
explica Dias-Neto. Os pesquisadores acreditam que algumas delas estariam
envolvidas na formação de vasos sanguíneos que nutrem as células
tumorais (angiogênese). “Aparentemente, diversas proteínas são
transferidas por meio das vesículas e várias delas podem participar,
assim como o HER2, dos processos biológicos que culminam no desenvolvimento do câncer”, diz.
No estudo, os pesquisadores fizeram uma análise do conteúdo dessas
vesículas, com o objetivo de identificar as proteínas que elas
transportavam e sua relação com as múltiplas cópias do HER2.
Identificaram 1466 proteínas compartilhadas pelas duas linhagens
celulares, das quais 26% foram encontradas nas vesículas por elas
secretadas. Já das 667 proteínas encontradas nas vesículas, 43% não
foram observadas nas células que as secretaram. “Esses resultados
reforçam a hipótese de as vesículas se comportarem como uma via de
transporte de proteínas específicas”, explica Dias-Neto.
Em seguida, os pesquisadores compararam as proteínas encontradas nas
vesículas produzidas por cada uma das duas linhagens celulares para
determinar quais eram mais afetadas, direta ou indiretamente, pela
superativação do HER2. Muitas proteínas, eles observaram, eram mais expressas nas vesículas da linhagem C5.2, que superexpressa o HER2.
Essas proteínas, explica Diana Nunes, estão relacionadas a processos
importantes para a malignidade de um câncer, como a angiogênese e a
regulação da metástase, a disseminação das células tumorais para outros
tecidos. Os resultados, segundo eles, coincidem com os de outros
estudos, que indicam que as metástases podem ser resultado da liberação
para o sistema circulatório e linfático de vesículas produzidas pelas
células tumorais.
No estudo, o grupo também observou que a quantidade de HER2 era muito maior nas vesículas das células C5.2. Com a maior quantidade do HER2
nas vesículas produzidas pelas células que já o superexpressa, os
autores sugerem que as células normais que recebessem estas vesículas
poderiam adquirir características das células tumorais. Além disso, a
presença do HER2 na membrana das vesículas poderia interferir
na ação da Trastuzumabe, um anticorpo monoclonal usado no tratamento de
pacientes com câncer de mama que expressam o HER2 em grandes quantidades. A hipótese é que, neste caso, a droga se ligue ao HER2 nas vesículas, e não nas células tumorais, como esperado, o que tornaria a terapia menos efetiva.
Projeto
Avaliação de micropartículas circulantes em pacientes com câncer de mama ductal invasivo HER2+ e sua possível relação com a agressividade tumoral (nº 2011/09172-3); Modalidade Auxílio Pesquisa – Regular; Pesquisador responsável Emmanuel Dias-Neto (A. C. Camargo Cancer Center); Investimento: R$ 399.755,31 (FAPESP).
Avaliação de micropartículas circulantes em pacientes com câncer de mama ductal invasivo HER2+ e sua possível relação com a agressividade tumoral (nº 2011/09172-3); Modalidade Auxílio Pesquisa – Regular; Pesquisador responsável Emmanuel Dias-Neto (A. C. Camargo Cancer Center); Investimento: R$ 399.755,31 (FAPESP).
Artigo científico
AMORIM, Maria et al. The overexpression of a single oncogene (ERBB2/HER2) alters the proteomic landscape of extracellular vesicles. Proteomics. v. 14, n. 12, p. 1472–79. 2014
AMORIM, Maria et al. The overexpression of a single oncogene (ERBB2/HER2) alters the proteomic landscape of extracellular vesicles. Proteomics. v. 14, n. 12, p. 1472–79. 2014
Fonte: Revista Fapesp
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