quinta-feira, 31 de dezembro de 2015
sexta-feira, 25 de dezembro de 2015
BOAS FESTAS!!!!
A BIOMEDICINA METODISTA DESEJA AOS
SEUS ALUNOS, CALOUROS, EGRESSOS, PROFESSORES E FUNCIONÁRIOS UM
FELIZ NATAL!!!!!
sábado, 12 de dezembro de 2015
Metodista oferece facilidades para alunos regularizarem situação financeira:
A Universidade Metodista de São Paulo está oferecendo aos
alunos que possuem mensalidades vencidas a oportunidade de
regularizarem a situação financeira junto à Instituição por meio de
descontos e possibilidade de parcelamento.
Para mais informações, compareça à Central de Relacionamento, de segunda a sexta-feira, das 9h às 21h.
terça-feira, 8 de dezembro de 2015
Novos achados genéticos
Mutação que mitiga a distrofia muscular em cães é descoberta e genes humanos associados a doenças raras são identificados
Desde 2004, os pesquisadores do Centro de Pesquisa sobre o Genoma Humano e Células-Tronco (CEGH-CEL), ligado ao Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo (IB-USP), desconfiavam que o golden retriever Ringo tinha algum mecanismo molecular que mitigava o aparecimento dos sintomas mais severos da distrofia muscular, como dificuldade para andar e deglutir. O cão, a exemplo do que ocorreria posteriormente com seu filhote Suflair, nunca produziu distrofina, proteína essencial para a manutenção da integridade dos músculos, e deveria ter sucumbido à degeneração progressiva da doença. Ambos, no entanto, sempre se mantiveram praticamente normais. Ringo morreu no ano passado aos 11 anos, tendo atingido uma expectativa de vida normal para cães, e Suflair continua bem, aos 9 anos e meio. Neste mês, o grupo da USP, em parceria com colegas da Escola Médica de Harvard e do Instituto Broad, dos Estados Unidos, publicou um artigo na revista científica Cell com a explicação do fenômeno: os dois golden retriever apresentam aumento na expressão (ativação) de um gene, o Jagged1, que os protege de desenvolver um quadro grave de distrofia muscular. O achado é promissor, pois, na opinião dos cientistas, sinaliza a possibilidade de explorar uma nova abordagem terapêutica, com o intuito de ao menos mitigar os sintomas da doença em seres humanos, por meio do controle do funcionamento desse gene.
A alteração genética descoberta faz com que o Jagged1 seja duas vezes mais expresso em Ringo e Suflair do que em cães severamente afetados pela doença. Ou seja, o gene é ativado de forma mais intensa e produz o dobro de sua respectiva proteína nos cachorros da USP do que nos animais doentes. Segundo o estudo, a anomalia no Jagged1 compensa o efeito deletério da ausência de distrofina, causada por mutações no gene responsável por produzir essa proteína. Isso porque uma das funções do Jagged1 é atuar sobre uma via de sinalização intracelular denominada Notch, envolvida na produção e reparação de células musculares.
“Pela primeira vez, mostramos que um animal de grande porte, sem distrofina, pode ter um músculo funcional”, diz Mayana Zatz, coordenadora do trabalho agora publicado e do CEGH-CEL, um dos 17 Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (Cepid) financiados pela FAPESP. “O paper abre caminho para testarmos novos tratamentos contra as distrofias musculares mais frequentes no homem, como as de Duchenne e de Becker, por meio de uma maior ativação do gene Jagged1.” As atuais tentativas de terapia contra as distrofias musculares, por ora com resultados modestos, concentram-se em tentar restaurar o funcionamento normal do gene da distrofina, no qual ocorrem as mutações que interrompem a produção dessa proteína e levam ao surgimento da doença.
Conhecer as bases moleculares das patologias é um passo importante para desenvolver tratamentos mais personalizados, uma tendência da medicina do século XXI. “No futuro próximo, os médicos vão olhar as informações genéticas e de funcionamento do metabolismo das pessoas e receitar o remédio mais adequado em uma dose individualizada”, afirma Mayana. As pesquisas contra o câncer caminham nessa direção, e uma iniciativa que envolve cinco Cepids, a Brazilian Initiative on Precision Medicine (BIPMed), criou uma plataforma computacional para integrar dados genéticos e clínicos de doenças e, assim, gerar tratamentos talhados para cada paciente.
Ambas as distrofias musculares, a de Duchenne, mais severa, e a de Becker, mais branda, são doenças recessivas que acometem essencialmente indivíduos do sexo masculino. A explicação para esse padrão de ocorrência é simples. O gene da distrofia fica no cromossomo X, do qual os homens têm uma cópia e as mulheres duas. Por isso, eles desenvolvem a doença ao herdar uma única cópia do gene com a mutação, ao passo que elas precisam de duas cópias com a alteração para manifestar a distrofia, algo muito raro de ocorrer. Quando portam uma cópia mutada, as mulheres, na maioria dos casos, são assintomáticas, mas têm, em cada gestação, 50% de risco de transmiti-la para seus descendentes. A distrofia de Duchenne afeta um a cada 3.500 recém-nascidos do sexo masculino, índice 10 vezes maior do que o de Becker.
A bióloga Natássia Vieira, que fez doutorado no IB-USP e permaneceu quase quatro anos nos Estados Unidos procurando a mutação protetora de Ringo e Suflair, foi uma das principais responsáveis pela descoberta. Ela passou uma temporada no laboratório de Louis M. Kunkel, da Escola Médica de Harvard, que identificara na segunda metade dos anos 1980 as mutações do gene da distrofina associadas à doença, e convenceu a geneticista sueca Kerstin Lindblad-Toh, diretora científica da área de Biologia do Genoma de Vertebrados do Instituto Broad, mantido por Harvard e pelo Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), a participar do projeto. Por isso, Kunkel e Lindblad-Toh são, ao lado de Mayana, os coautores seniores do estudo da Cell.
Como pista inicial de onde procurar a hipotética mutação protetora, Natássia contava com os dados de um experimento feito cinco anos atrás em colaboração com o laboratório de Sergio Verjovski-Almeida, do Instituto de Química (IQ) da USP. “Vimos, com o emprego de um chip de DNA, que 66 genes tinham um perfil de expressão alterado nos cães assintomáticos em relação aos animais com o quadro de distrofia”, afirma Verjovski-Almeida, que também contribuiu com o novo trabalho. No laboratório de Lindblad-Toh, Natássia sequenciou todo o genoma de Ringo e Suflair e de um terceiro golden retriever com um quadro severo de distrofia muscular. Descobriu que havia uma pequena mutação em um dos 66 genes que haviam chamado a atenção no trabalho com o IQ-USP: a troca de uma única base nitrogenada (a unidade química que compõe todo o DNA) na região que regula o funcionamento do gene Jagged1, localizado no cromossomo 24 do cachorro, era a mutação que procuravam há anos.
Em seguida, a bióloga voltou ao laboratório de Kunkel e fez experimentos com RNA mensageiro em peixes paulistinha (ou zebrafish), um dos modelos biológicos mais usados para simular doenças humanas em animais. A ideia era ver se, ao estimular a ativação do gene Jagged1, como ocorre com os cachorros, os peixes apresentariam menor prevalência de um quadro equivalente à distrofia muscular humana. Deu certo. “A incidência da doença caiu dos esperados 25% para 6%”, afirma Natássia. Dessa forma, os pesquisadores colheram fortes evidências de que a mutação no gene Jagged1, que no ser humano se encontra no cromossomo 20, é capaz de atenuar a manifestação clínica das distrofias musculares.
Avanços nas doenças raras
A identificação de um provável mecanismo molecular que mitiga o desenvolvimento das distrofias não foi o único trabalho recente do CEGH-CEL a produzir resultados substanciais no entendimento de doenças genéticas. Em artigo publicado on-line em 29 de setembro na revista científica Human Molecular Genetics, outro grupo de pesquisadores ligados ao centro da USP mostrou que pacientes com uma rara síndrome hereditária neurodegenerativa não apresentam uma sequência com 216 pares de bases na região que controla o funcionamento de um gene do cromossomo 11, o KLC2. A identificação da alteração genética demorou 10 anos. Em 2005, enquanto fazia estágio de pós-doutorado no CEGH-CEL, a bióloga paulista Silvana Santos foi a principal responsável pela descoberta da doença em um município de 5 mil habitantes do interior do Rio Grande do Norte, Serrinha dos Pintos, onde um terço dos casamentos era consanguíneo, entre primos de primeiro ou segundo grau. “Foi muito difícil encontrar a mutação. Apenas com as novas técnicas de sequenciamento conseguimos ter sucesso”, comenta Mayana Zatz.
Denominada síndrome Spoan, sigla que, em inglês, significa Spastic Paraplegia, Optic Atrophy and Neuropathy, a doença causa uma série de sintomas clínicos que levam os pacientes a viver em uma cadeira de rodas a partir da adolescência: o contínuo enrijecimento e enfraquecimento das pernas e braços, lesões progressivas nos neurônios motores e sensoriais e diminuição do campo de visão, resultante da atrofia congênita do nervo óptico (ver Pesquisa FAPESP nº 113). Esse esforço de uma década mobilizou Silvana, que desde 2008 é professora da Universidade Estadual da Paraíba (UEPB), em Campina Grande, pesquisadores do CEGH-CEL da USP, de outras universidades brasileiras e até do exterior e incluiu várias idas a campo pelo interior da Paraíba e do Rio Grande do Norte. Durante as viagens, além de informações sobre a Spoan, os pesquisadores descobriram dois novos distúrbios neurológicos, e o mecanismo genético que os ocasiona, em comunidades relativamente isoladas do Nordeste. Essas novas doenças, igualmente raras, foram apresentadas à comunidade científica em dois trabalhos recém-publicados. “Da mesma forma que a Spoan, essas duas doenças se originam em famílias com muitas uniões consanguíneas”, afirma Silvana.
Como os estudos iniciais já indicavam na década passada, a alteração genética responsável por provocar a Spoan se encontra em uma região do cromossomo 11 com mais de 140 genes. Essa pista sempre esteve correta. O que os pesquisadores não tinham como saber era que a mutação estava em um trecho de DNA pouco estudado até alguns anos atrás. A mutação associada à síndrome não está na chamada região codificadora, a parte da sequência que contém as instruções específicas para a produção da proteína associada a cada gene de um organismo. Tal região é o lugar de ocorrência mais comum de mutações associadas ao aparecimento de patologias. Por isso, tradicionalmente é o primeiro alvo da busca por alterações genéticas com repercussões clínicas. Mas a mutação ligada à síndrome de Serrinha dos Pintos se encontra em uma área regulatória do gene KLC2.
A perda de um trecho de 216 pares de base na região que controla o gene faz com que ele funcione em excesso. O KLC2 é mais ativado do que o normal nos doentes e produz uma quantidade extra de cinesina, membro de uma classe de proteínas motoras que transportam organelas do corpo celular até o axônio, a parte do neurônio que conduz os impulsos elétricos. Ou seja, a mutação na região regulatória não leva à produção de uma forma alterada da proteína nem impede sua fabricação, como ocorre na maior parte das doenças genéticas, mas desregula a quantidade produzida da proteína. “Essa é a primeira doença autossômica recessiva descrita como resultado de uma mutação que faz um gene ganhar, em vez de perder, uma função”, diz Silvana.
Os pacientes que desenvolvem Spoan herdaram as duas cópias do gene KLC2, uma do pai e outra da mãe, com a alteração que causa a doença. É por isso que a síndrome é denominada recessiva. Pessoas com apenas uma cópia alterada são portadoras da mutação, que pode ser transmitida aos filhos, mas são clinicamente normais. Se a doença fosse dominante, bastaria ter uma cópia do gene com a mutação para desenvolver o problema de saúde. “O defeito que causa a Spoan estava em um gene que havíamos investigado em 2006”, conta a bióloga Lúcia Inês Macedo de Souza, que se dedicou entre 2005 e 2013 a procurar a alteração genética responsável pela síndrome, durante seu doutorado e pós-doutorado no IB-USP. “Mas, na época, não tínhamos no mundo tecnologia para sequenciar todo o genoma a um custo baixo. Só conseguimos fazer isso em dezembro de 2012.”
Na cauda do zebrafish
Natural de Campina Grande, o biólogo Uirá Souto Melo, que faz doutorado sobre a Spoan sob a supervisão de pesquisadores do CEGH-CEL, realizou um experimento que reforçou a ligação do gene KLC2 com a síndrome. Ele permaneceu três meses na equipe de Nora Calcaterra, da Universidade Nacional de Rosário (Argentina), antiga parceira do centro da USP, onde usou ozebrafish para estudos sobre a função do gene. Melo injetou doses extras de RNA mensageiro (a receita química para a produção de uma proteína) extraído do KLC2 em embriões de paulistinha. Conforme a dose de RNA era aumentada, a cauda do peixe entortava mais, um fenótipo que pode ser interpretado como a manifestação de uma doença neurodegenerativa. “No momento estou tentando desenvolver um camundongo transgênico com a mutação da Spoan”, afirma Melo, que passa uma temporada na Universidade da Califórnia em Berkeley. “Dessa forma, ficaria mais fácil fazer um modelo biológico da doença em um animal geneticamente mais parecido com o ser humano.”
Na década passada, por questões de custo e de limitações da tecnologia, os sequenciamentos se concentravam na região codificadora do genoma humano, que representa de 2% a 3% da sequência total. O restante do genoma, cerca de 97% da sequência, chegou até a ser denominado “DNA lixo” nos primeiros anos após o término do projeto de sequenciamento de todos os genes do ser humano, em 2003. Achava-se que não servia para nada. Mas essa visão mudou radicalmente com o passar do tempo e a criação e a disseminação de novas técnicas de sequenciamento. Hoje, conhecer a composição química de todo o material genético do homem, inclusive das áreas não codificadoras, tornou-se uma tarefa muita mais rápida, barata e, como mostra o estudo com a Spoan, importante. Segundo levantamento feito pelo National Human Genome Research Institute (NHGRI), dos Estados Unidos, o custo de sequenciar todo o genoma de uma pessoa era, em setembro de 2001, de US$ 95 milhões. Em julho deste ano, a mesma empreitada custava US$ 1,3 mil.
A descoberta da mutação no gene não abre caminho, em um primeiro momento, para a cura da Spoan, cujos afetados não têm prejuízo cognitivo nem sentem dor, mas veem sua qualidade de vida se deteriorar rapidamente. No entanto, possibilita desenvolver um teste capaz de prever a ocorrência da doença em filhos de pais portadores da mutação. Dez anos atrás, quando foi descoberta, a Spoan tinha acometido 26 moradores (17 mulheres e 9 homens) de Serrinha dos Pintos, todos descendentes de casais aparentados, de 19 uniões consanguíneas. Agora o número de afetados chega a 61 no Rio Grande do Norte, distribuídos por oito cidades (dois terços deles em Serrinha e São Miguel), e 14 em outros quatro estados (5 em São Paulo, 5 na Paraíba, 2 no Ceará e 2 no Rio Grande do Sul). “Tivemos contato com dois casos no Egito, nos quais também confirmamos a mutação na região regulatória do gene KLC2”, diz Silvana.
Mutação e judeus sefarditas
Um detalhe sempre chamou a atenção dos pesquisadores quando identificaram os primeiros afetados pela Spoan em Serrinha dos Pintos. Todos os pacientes tinham nascido naquela região, eram caucasianos, descendentes distantes de portugueses ou de holandeses que dominaram parte do Nordeste no século XVII. Essa situação levou-os a formular a hipótese de que a mutação pode ter sido introduzida na região pelos europeus na época do Brasil holandês. O DNA de 68 afetados pela síndrome e de 85 familiares que carregam a mutação (mas não têm a doença) está sendo analisado para tentar determinar quando a alteração genética surgiu. Com sorte, também será possível determinar se a mutação apareceu em solo brasileiro ou foi trazida por imigrantes. “Os dados preliminares sugerem que a mutação pode ter chegado ao Nordeste com os judeus sefarditas, originários da comunidade judaica de Portugal e da Espanha, no tempo do Brasil holandês”, diz Silvana.
Os estudos que levaram à descoberta da Spoan começaram na primeira metade dos anos 2000. Silvana ainda morava em São Paulo e ficou intrigada com a história de uma vizinha com um tipo de paraplegia que ninguém sabia dizer exatamente o que era. Essa moça dizia ser de uma família de Serrinha dos Pintos com muitos membros afetados pelo mesmo problema de saúde. Silvana foi ao pequeno município do interior potiguar e viu que a incidência da doença e de outros distúrbios neuromotores era grande em toda aquela região. A Spoan, descrita na literatura científica em 2005, foi sua primeira descoberta, quando ainda fazia parte da equipe do CEGH-CEL na USP. Em 2008, ela foi contratada pela UEPB e deu continuidade aos estudos com doenças ligadas à consanguinidade. “Desde então, ela tem sido uma ótima parceira do nosso centro, mandando alunos para cá e fazendo estudos conjuntos”, diz Mayana Zatz.
Em 2009, Silvana e seus alunos da UEPB firmaram uma parceria com 39 municípios do sertão paraibano e, com o apoio de agentes comunitários de saúde, entrevistaram 20.462 casais para tentar estabelecer a frequência de uniões consanguíneas em diferentes localidades. O resultado do estudo apontou números elevados: a taxa variou de 6% a 41%, dependendo da cidade. Em 2012, o grupo da UEPB e uma equipe de neurologistas da USP examinaram 109 indivíduos com algum tipo de deficiência física ou mental oriundos de seis municípios paraibanos com elevados índices de consanguinidade (Bom Sucesso, Brejo dos Santos, Catolé do Rocha, Belém do Brejo do Cruz, São José do Brejo do Cruz e Brejo do Cruz). Essas incursões por lugares com muitos casamentos entre parentes facilitaram a descoberta de mais casos de Spoan e também de novas doenças raras, como os dois problemas neurológicos agora divulgados em periódicos científicos. “Fizemos um livro eletrônico gratuito, intituladoTem alguma pessoa com deficiência na sua família?, e o disponibilizamos no site da UEPB ”, afirma Silvana.
Uma das novas doenças é um tipo de deficiência intelectual (antigamente chamado de retardo mental) que provoca sexualidade exacerbada e alterações anatômicas na face (prognatismo, queixo proeminente e nariz muito grande), encontrada em sete indivíduos de uma mesma família originária do município de Catolé do Rocha, Paraíba. Hoje três dos afetados vivem em Mossoró, no Rio Grande do Norte, mas o núcleo original do clã é o município paraibano. Em artigo publicado em dezembro do ano passado no Journal of Medical Genetics, os cientistas descreveram a doença e a mutação no gene MED25, do cromossomo 19, que a causa. “Tivemos sorte”, comenta a bióloga Thalita Figueiredo, que fez doutorado na UEPB sob a orientação de Silvana e é a primeira autora do estudo. “Três meses depois do nosso trabalho, um grupo internacional descreveu famílias com outra mutação nesse mesmo gene.” O MED25 faz parte de uma grande família de genes, associada a diversas formas de deficiência intelectual.
O segundo distúrbio neurológico, ainda sem nome, ocorre em razão de uma mutação identificada no gene Inositol monophosphatase 1 (Impa1), localizado no cromossomo 8. Trata-se de uma doença que causa deficiência intelectual e alterações comportamentais, como agitação e agressividade. Ela foi descoberta em uma família de Brejo dos Santos com nove afetados. “Esse trabalho abre uma perspectiva interessante para novas pesquisas”, afirma o neurologista Fernando Kok, pesquisador do CEGH-CEL e diretor médico da Mendelics, laboratório privado dedicado à análise genômica, que participou do sequenciamento das três doenças. “O lítio dado aos pacientes com transtorno bipolar inibe a ação do gene.” No entanto, antes da publicação do estudo dos pesquisadores brasileiros, que saiu em 2 de outubro na revista Molecular Psychiatry, nenhum problema mental havia sido associado ao Impa1.
Os trabalhos sobre novas e velhas doenças genéticas raras no Nordeste estão longe de ter fim. No caso da Spoan, o desafio agora é entender o mecanismo fisiológico, a cadeia de eventos, que a mutação provoca nos afetados pela síndrome e os empurra progressivamente para uma vida em uma cadeira de rodas. A alta prevalência de distúrbios e síndromes ocasionados por casamentos entre cônjuges aparentados é um indício de que ainda há muito a ser pesquisado nessa seara. Um levantamento nacional divulgado no ano passado aponta que existem cerca de 4 mil pessoas de mais de 80 municípios, a maioria do Nordeste, que apresentam doenças genéticas de baixa incidência em comunidades relativamente isoladas do país. “Vários países dão bastante atenção às populações com alta taxa de consanguinidade ou baixa diversidade genética, como os Amish nos Estados Unidos, os franco-canadenses no Canadá, os árabe-israelenses em Israel e os finlandeses”, comenta Kok. “Ainda sabemos muito pouco sobre as doenças genéticas no Brasil.” Os avanços dos estudos genéticos, impulsionados por novas tecnologias e por uma melhor capacidade de analisar vastas quantidades de dados, estão permitindo, no entanto, conhecer um pouco mais as raízes de patologias raras, como a Spoan, e também de condições bem mais comuns, como as distrofias musculares.
Mutações em dois novos genes causam a síndrome de Noonan
Estudo amplia base molecular da doença e eleva para 11 o número de genes implicados na condição clínica
Pesquisadores do CEGH-CEL descobriram dois novos genes associados à síndrome de Noonan, doença de prevalência quase tão elevada quanto a síndrome de Down. De acordo com artigo publicado em junho no Journal of Medical Genetics, mutações nos genes S0S2 e LZTR1 são responsáveis por 3% dos casos da doença. O primeiro gene está no cromossomo 2; o segundo, no 22.
Um a cada 2,5 mil recém-nascidos, segundo algumas estimativas, ou um a cada mil, de acordo com outras, é acometido pela síndrome, que pode afetar diferentes áreas do corpo (ver figura ao lado). “As anomalias mais importantes que levam os pais a procurar o serviço médico são as cardíacas e a baixa estatura”, afirma a geneticista Débora Bertola, do CEGH-CEL e médica do Instituto da Criança do Hospital das Clínicas (HC) da USP, principal autora do estudo. “As características clínicas da síndrome são muito variáveis. É provável que muitos indivíduos afetados nem saibam que a têm.” Em geral, a doença não afeta a expectativa de vida dos pacientes.
A síndrome de Noonan é classificada como uma doença monogênica autossômica dominante. Basta herdar uma única cópia de um único gene com uma mutação patogênica para desenvolvê-la. Antes do trabalho do CEGH-CEL, mutações em nove genes estavam associadas a 80% dos casos da doença. Em geral, os afetados têm alguma mutação deletéria em apenas um dos genes que podem causar a síndrome.
Com o estudo dos brasileiros, o número de genes ligados à sindrome aumentou para 11. “A dificuldade hoje é encontrar genes que respondam por uma porcentagem muito pequena dos casos da doença”, explica Débora. “A descoberta das mutações nesses dois genes melhora a eficiência do diagnóstico molecular da síndrome”, afirma Maria Rita Passos-Bueno, coordenadora da área de Transferência de Tecnologia do CEGH-CEL. Com exceção do LZTR1, todos os demais genes responsáveis pelo desenvolvimento da síndrome estão associados à via de sinalização RAS/MAPK, cuja desregulação parece ser crucial para a origem da doença. Para descobrir a associação dos dois genes com a síndrome, foi sequenciada a parte codificante do genoma de 50 pacientes do HC que tinham a doença, mas não apresentavam mutações nos nove genes até então sabidamente ligados à patologia.
Projetos
1. CEGH-CEL – Centro de Estudos do Genoma Humano e de Células-Tronco (nº 2013/08028-1); Modalidade Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (Cepid);Pesquisadora responsável Mayana Zatz (IB-USP); Investimento R$ 9.609.746,03 e US$ 4.676.005,00 para todo o projeto.
2. Programa de Pesquisa do Núcleo de Estudos em Genética e Educação da Universidade Estadual da Paraíba (NEGE-UEPB); Pesquisadora responsávelSilvana Santos (UEPB); Investimento R$ 200.000,00 (Propesq/UEPB, Fapesq/CNPq, Biomarin).
1. CEGH-CEL – Centro de Estudos do Genoma Humano e de Células-Tronco (nº 2013/08028-1); Modalidade Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (Cepid);Pesquisadora responsável Mayana Zatz (IB-USP); Investimento R$ 9.609.746,03 e US$ 4.676.005,00 para todo o projeto.
2. Programa de Pesquisa do Núcleo de Estudos em Genética e Educação da Universidade Estadual da Paraíba (NEGE-UEPB); Pesquisadora responsávelSilvana Santos (UEPB); Investimento R$ 200.000,00 (Propesq/UEPB, Fapesq/CNPq, Biomarin).
Artigos científicosVIEIRA, N. M. et al. Jagged1 mitigates the Duchenne muscular dystrophy phenotype.Cell. 12 nov. 2015.
MELO, U. S. et al. Overexpression of KLC2 due to a homozygous deletion in the non-coding region causes Spoan syndrome. Human Molecular Genetics. 18 set. 2015.
FIGUEIREDO, T. et al. A homozygous loss-of-function mutation in inositol monophosphatase 1 (Impa1) causes severe intellectual disability. Molecular Psychiatry. 29 set. 2015.
FIGUEIREDO, T. et al. Homozygous missense mutation in MED25 segregates with syndromic intellectual disability in a large consanguineous family. Journal of Medical Genetics. 19 dez. 2014
YAMAMOTO, G. L. et al. Rare variants in SOS2 and LZTR1 are associated with Noonan syndrome. Journal of Medical Genetics. v. 52, 6, p. 413-21. jun. 2015.
MELO, U. S. et al. Overexpression of KLC2 due to a homozygous deletion in the non-coding region causes Spoan syndrome. Human Molecular Genetics. 18 set. 2015.
FIGUEIREDO, T. et al. A homozygous loss-of-function mutation in inositol monophosphatase 1 (Impa1) causes severe intellectual disability. Molecular Psychiatry. 29 set. 2015.
FIGUEIREDO, T. et al. Homozygous missense mutation in MED25 segregates with syndromic intellectual disability in a large consanguineous family. Journal of Medical Genetics. 19 dez. 2014
YAMAMOTO, G. L. et al. Rare variants in SOS2 and LZTR1 are associated with Noonan syndrome. Journal of Medical Genetics. v. 52, 6, p. 413-21. jun. 2015.
Fonte: Revista Fapesp - ed.237 Por: Marcos Pivetta
Corrida contra a malária
Médicos monitoram resistência do parasita aos medicamentos em uso, enquanto bioquímicos buscam alternativas
A erradicação mundial da malária parecia estar próxima de ocorrer em 1979 quando a equipe da farmacologista chinesa Youyou Tu publicou seu estudo demonstrando a ação potente da artemisinina, princípio ativo obtido da erva Artemisia annua, contra a espécie mais letal do parasita causador da doença, o protozoário Plasmodium falciparum. A identificação e a síntese em laboratório do composto salvaram milhões de vidas por reduzir drasticamente a mortalidade por malária e renderam a Tu o Prêmio Nobel de Medicina e Fisiologia deste ano (ver reportagem). Desde os anos 2000, no entanto, a artemisinina e seus derivados vêm perdendo parte de seu poder antimalárico em cinco países do Sudeste Asiático.
“Nessas regiões, a artemisinina, que antes eliminava o parasita do sangue do paciente no segundo dia de tratamento, só consegue agora depois do terceiro dia”, diz o médico Marcus Vinícius Lacerda, pesquisador da Fundação de Medicina Tropical Dr. Heitor Vieira Dourado (FMT-HVD), do governo do Amazonas, em Manaus. “Já existe uma pequena população de P. falciparum resistente à artemisinina, problema que deve começar a crescer e se espalhar à medida que o tratamento eliminar os parasitas ainda sensíveis ao efeito desse composto”, conta Lacerda, que também é pesquisador do Instituto Leônidas e Maria Deane, da Fundação Oswaldo Cruz em Manaus.
Lacerda acompanha um efeito parecido na Amazônia brasileira, mas envolvendo o Plasmodium vivax, espécie responsável por 85% dos casos de malária no Brasil. Em um trabalho a ser publicado na revista Lancet Global Health, Lacerda e seus colegas da FMT-HVD realizaram um ensaio clínico de fase 3 para avaliar a segurança e a eficácia do combate ao P. vivax com um medicamento fabricado pela empresa farmacêutica Sanofi. O novo remédio combina dois compostos: o artesunato, obtido a partir da artemisinina, e a amodiaquina. No trabalho, a eficácia dessa combinação foi comparada com a do fármaco cloroquina, usado no mundo todo para tratar a malária causada por P. vivax.
Os pesquisadores acompanharam por 42 dias dois grupos de pacientes da cidade de Manaus – cada grupo recebeu um tratamento diferente. Nesse período, foi avaliada a capacidade das drogas de reduzir – e até mesmo eliminar completamente – o número de parasitas no interior dos glóbulos vermelhos do sangue. O estudo demonstrou que a combinação de artesunato e amodiaquina funciona melhor que a cloroquina. Mais importante: revelou também que a cloroquina falhou em 10% dos casos.
Esse resultado, apresentado na XIV Reunião Nacional de Pesquisa em Malária, realizada no início de outubro em São Paulo, reforça os achados de estudos anteriores conduzidos por Lacerda. Ele já havia observado que de 5% a 10% dos casos de malária causada por P. vivax em Manaus não respondem bem ao tratamento com a cloroquina, um medicamento relativamente barato em comparação com os derivados de artemisinina.
“Esse é um dado alarmante”, considera o médico Marcelo Urbano Ferreira, do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo (ICB-USP). Ferreira investiga o risco de surgir resistência aos medicamentos antimaláricos na Amazônia, especialmente no Acre. Até o momento, sua equipe não encontrou evidência de resistência dePlasmodium vivax à cloroquina no Alto Juruá, hoje a região brasileira com maior incidência de malária. “A Organização Mundial da Saúde sugere que uma terapia deve ser trocada quando falha em mais de 10% dos casos”, diz.
Ferreira nota, entretanto, que esse nível elevado de resistência do P. vivax deve ocorrer apenas em Manaus. Junto com Lígia Gonçalves, pesquisadora visitante no ICB-USP, e Pedro Cravo, da Universidade Federal de Goiás, Ferreira fez uma revisão na literatura científica em busca de casos de resistência de P. vivax à cloroquina na América Latina. Dos anos 1990 para cá, há relatos de resistência no Brasil, no Peru e de turistas infectados na Guiana. Neste ano também surgiram relatos de resistência do P. vivax na Amazônia boliviana, próximo à fronteira com Rondônia. “Ainda é um fenômeno raro no país, mas a vigilância é fundamental”, diz Ferreira, que publicou a revisão no ano passado na revista Memórias do Instituto Oswaldo Cruz.
Desenvolvida por pesquisadores alemães nos anos 1930 para substituir o quinino, que ainda funciona, mas provoca efeitos colaterais graves, a cloroquina foi o principal antimalárico usado nas campanhas mundiais de erradicação da doença após a Segunda Guerra Mundial. Já nos anos 1950 começaram a surgir os primeiros relatos deP. falciparum resistentes à cloroquina na América do Sul e no Sudeste Asiático. Em pouco menos de 40 anos, a resistência se disseminou pelo mundo. “Atualmente, as únicas regiões do mundo nas quais ainda existe P. falciparum sensível à cloroquina são a América Central, o Haiti e a República Dominicana”, conta Ferreira.
De meados dos anos 2000 para cá, as autoridades internacionais da saúde recomendam que os compostos derivados de artemisinina sejam sempre administrados em conjunto com uma droga com mecanismo de ação diferente. O objetivo é evitar a disseminação de variedades de P. falciparum resistentes à artemisinina. No Brasil, por exemplo, a malária causada por P. falciparum é tratada com uma combinação de um derivado de artemisinina, o artemeter, com lumefantrina. “Ainda que o parasita desenvolva resistência a uma das drogas, ele não vai sobreviver se não desenvolver resistência à segunda também”, explica Ferreira. Ape-sar dessa estratégia, já há relatos de resistência a terapias combinadas no Sudeste Asiático. “Temos de estar sempre vigilantes e buscar novas formulações de drogas, com outros mecanismos de ação bioquímica.”
Alguns pesquisadores tentam caminhos alternativos para alcançar o mesmo objetivo. Pedro Melillo Magalhães, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), coordenou um estudo que testou o emprego de um chá antimalárico, feito a partir de folhas de uma variedade enriquecida da Artemisia annua, com uma concentração 100 vezes maior de artemisinina do que a da erva selvagem, em 17 pacientes não-graves do Pará infectados pelo P. falciparum. O chá eliminou a presença do parasita em todos os pacientes em até três dias após seu uso. No entanto, o protozoário reapareceu nos doentes antes de se completar um mês de terapia. Para preservar a saúde dos participantes do trabalho, feito em parceria com pesquisadores do Instituto Evandro Chagas, do Pará, e da Universidade de Oxford, na Inglaterra, os pacientes receberam o tratamento convencional contra a malária (artemeter e lumefantrina). “O emprego do chá sozinho obteve os mesmos resultados que o uso da artemisinina isolada”, afirma Magalhães, que trabalha na divisão de agrotecnologia do Centro Pluridisciplinar de Pesquisas Químicas, Biológicas e Agrícolas (CPQBA) da Unicamp. “Mas com uma dose equivalente a um terço da recomendada para a artemisinina.”
Para evitar que os parasitas reapareçam nos pacientes, Magalhães defende o uso combinado do chá com um medicamento antimalárico, em esquema parecido com o que se emprega atualmente a artemisinina. O próximo passo dos estudos do pesquisador da Unicamp será testar essa terapia combinada de chá mais uma medicação em pacientes do Pará com malária causada pelo P. vivax.
Vias alternativas
O bioquímico Rafael Guido, do Laboratório de Química Medicinal e Computacional da USP em São Carlos, ressalta a necessidade de se encontrarem novos alvos no metabolismo do plasmódio para medicamentos contra a malária. “Quase todos os que existem convergem para os mesmos alvos”, explica. O grupo dele está estudando a enolase, proteína usada pelo parasita para produzir energia.
Estudos recentes têm mostrado que o gene que produz a enolase não está ativo apenas dentro da célula, onde funciona a fábrica de energia, mas também em outros lugares, como na membrana celular – na qual tem uma função na sinalização celular. O grupo de Guido acaba de descobrir uma região que pode revelar uma nova função da enolase e começou a testar a atividade de uma série de substâncias contra essa proteína.
São compostos fornecidos pela organização não-governamental Medicines for Malaria Venture (MMV), que fez uma curadoria em bases de dados da indústria farmacêutica e selecionou os promissores. “Já se sabe que eles têm atividade contra a malária, mas não se sabe o mecanismo”, diz Guido. Nos testes, alguns dos compostos foram bem-sucedidos em bloquear a enolase. “Cinco compostos conseguiram 100% de inibição, 10 inibiram 80% da expressão da enolase e 38 obtiveram 50% de inibição”, adianta. Agora falta trabalhar com essas substâncias para deixá-las mais potentes sem afetar a enolase humana.
Um dos problemas para encontrar novos antimaláricos é que ainda não se conhece a função de metade dos cerca de 5 mil genes das duas espécies do parasita. “É muito difícil estudar uma via bioquímica quando não se sabe quais genes codificam as proteínas envolvidas nela”, diz a química Célia Garcia, do Instituto de Biociências da USP. Desde o final dos anos 1990, o laboratório de Célia vem desvendando como funcionam algumas dessas vias bioquímicas essenciais à sobrevivência dos parasitas causadores da malária. São conjuntos de reações químicas que permitem ao protozoário perceber o ambiente a sua volta, em especial quando invade os glóbulos vermelhos e se multiplica em seu interior.
Célia e sua equipe demonstraram, por exemplo, que o parasita é capaz de controlar a concentração de cálcio ao seu redor, algo fundamental para que consiga se multiplicar, e também sincronizar sua fase reprodutiva aproveitando a melatonina, composto que regula o ciclo de vigília e sono do corpo humano. Em parceria com o grupo do bioquímico Andrew Thomas, da Universidade de Rutgers, Estados Unidos, a pesquisadora vem testando uma série de compostos com o potencial de bloquear a capacidade do parasita de perceber a melatonina. Ela e outros químicos brasileiros também buscam identificar compostos que atuem em outras vias bioquímicas do parasita.
O bioquímico alemão Carsten Wrenger, do ICB-USP, segue uma abordagem diferente. Quando trabalhava em Hamburgo, Wrenger e seus colegas identificaram na metade conhecida do genoma das duas espécies de Plasmodium duas vias bioquímicas essenciais para o metabolismo do parasita e ausentes nas células do ser humano. Assim como os seres humanos, o Plasmodium precisa das vitaminas B1 e B6 para sobreviver. Sem elas, mais de 100 enzimas essenciais não funcionam. Mas, enquanto as pessoas só as obtêm por meio da dieta, o protozoário fabrica suas próprias vitaminas.
Em 2013, Wrenger e colegas sintetizaram em laboratório um composto a partir do qual o Plasmodium produz uma versão defeituosa da vitamina B1. “Esse composto é inerte para o organismo humano e o parasita o modifica criando uma versão da vitamina que não funciona”, explica Wrenger. “Sem a vitamina, o metabolismo do parasita para.” Ele continua a buscar e desenhar compostos que impeçam o protozoário de produzir as vitaminas B1 e B6. “Identificar esse tipo de composto é complicado”, diz. “A vantagem é que ele poderia atuar em mais de 100 alvos ao mesmo tempo.”
No Instituto de Química da Unicamp, o químico Luiz Carlos Dias e sua equipe trabalham desde 2013 com a MMV no aprimoramento de uma nova classe de compostos promissores contra a malária. São moléculas que inibem a atividade da enzima PI(4)K, identificadas em 2013 por pesquisadores da empresa farmacêutica Novartis. Em testes com animais de laboratório, esses compostos foram capazes de eliminar as variedades de P. falciparum e P. vivax mais resistentes aos medicamentos hoje disponíveis para tratar a malária. Segundo Dias, o que mais desperta o interesse nessa molécula é que ela consegue matar o parasita nos diferentes estágios de seu ciclo de vida no organismo dos mamíferos. “Atualmente nenhum medicamento faz isso, apenas compostos que ainda estão em ensaios clínicos”, afirma.
A partir da estrutura do inibidor da PI(4)K, Dias e seus colaboradores sintetizaram cerca de 60 compostos e encaminharam para serem testados em instituições de pesquisa de diferentes países. Apesar de promissores, um experimento realizado na biofarmacêutica AbbVie, nos Estados Unidos, e na Universidade de Dundee, na Escócia, mostrou que esses compostos interagem com uma das 140 proteínas quinases humanas testadas. Os pesquisadores não sabem qual a consequência dessa interação, mas, para não correr riscos, precisarão alterar a estrutura dessa classe de compostos. “Temos de entender como eles interagem com a quinase do parasita e com a humana para aumentar a primeira interação e impedir a segunda”, explica Dias. Ele pretende criar um consórcio com equipes de outras universidades paulistas para realizar parte dos testes com células e animais de laboratório no país.
Projetos
1. Genômica funcional em Plasmodium (nº 2011/51295-5); Modalidade Projeto Temático; Pesquisadora responsável Célia Regina da Silva Garcia (IB-USP);Investimento R$ 2.068.066,18.
2. Metabolismo de vitamina B no parasita da malária humana Plasmodium falciparum e a sua validação como alvo para quimioterapia (nº 2010/20647-0);Modalidade Bolsa no País – Programa Jovem Pesquisador; Pesquisador responsável Carsten Wrenger (ICB-USP); Investimento R$ 179.861,70.
3. Pesquisa clínica de extratos vegetais no tratamento da malária a partir de matéria-prima padronizada: Artemisia annua (var. CPQBA) (nº 2009/53639-3); ModalidadeProjeto Temático-Pronex; Pesquisador responsável Pedro Melillo de Magalhães (CPQBA-Unicamp); Investimento R$ 16.874,70.
4. Descoberta e planejamento de inibidores de enolase de Plasmodium facilparumcomo novos agentes antimaláricos (nº 2014/26313-8); Modalidade Bolsas no Brasil – Pós-doutorado; Pesquisador responsável Rafael Victorio Carvalho Guido (IFSC-USP); Bolsista Lorena Ramos Freitas de Sousa; Investimento R$ 169.558,00.
Artigos científicos
GONÇALVES, L. A. et al. Emerging Plasmodium vivax resistance to chloroquine in South America: an overview. Memórias do Instituto Oswaldo Cruz. v. 109 (5). ago. 2014.
ALVES, E. et al. Encapsulation of metalloporphyrins improves their capacity to block the viability of the human malaria parasite Plasmodium falciparum. Nanomedicine. v. 11 (2). fev. 2015.
CHAN, X. W. A. et al. Chemical and genetic validation of thiamine utilization as an antimalarial drug target. Nature Communications. 28 mai. 2013.
FONTE: REVISTA FAPESP ED. 237/ 2015
Por Igor Zolnerkevic
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