Colaboradores

quinta-feira, 31 de outubro de 2013

Alumínio nas veias: Metal presente no vidro contamina fármacos e pode prejudicar bebês prematuros e pacientes renais


© EDUARDO CESAR
Frascos: quanto mais resistentes ao calor, mais metal contêm
Frascos: quanto mais resistentes ao calor, mais metal contêm
O vidro é considerado o material mais seguro para armazenar medicamentos. Resistente ao calor, ele pode ser esterilizado a altas temperaturas. Mas essa característica que facilita a eliminação de microrganismos aumenta também o risco de contaminação com elementos químicos prejudiciais à saúde. Estudos conduzidos pela química Denise Bohrer, da Universidade Federal de Santa Maria, indicam que certos componentes dos medicamentos ou de soluções nutritivas podem incorporar o alumínio do vidro e causar intoxicação. De acordo com estudos internacionais dos anos 1980, o acúmulo de alumínio nos ossos – em substituição ao cálcio – causa deficiências no crescimento e fragilidade óssea. No cérebro de recém-nascidos, causaria atraso no desenvolvimento mental.
A contaminação por alumínio é especialmente preocupante quando atinge pacientes renais e bebês prematuros, cujo organismo tem dificuldade em eliminá-lo. Em artigo de 2010 na revista Journal of Pediatric Gastroenterology and Nutrition, o grupo de Denise analisou 10 recém-nascidos prematuros internados na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) neonatal do Hospital Universitário de Santa Maria. A cada dia de tratamento os bebês receberam na nutrição parenteral, em média, 15 microgramas (μg) de alumínio por quilograma do próprio peso – o triplo da quantidade máxima preconizada pela agência norte-americana de controle de alimentos e medicamentos (FDA). O mais grave foi constatar que, por não ter as funções renais desenvolvidas, os bebês não conseguiam eliminar boa parte desse alumínio: menos da metade saía na urina. “A consequência é que o metal se deposita nos ossos e no cérebro”, afirma a pesquisadora. Embora tenha detectado esse efeito no curto prazo, ela ainda não conseguiu documentar os efeitos de longo prazo do acúmulo. Na sua avaliação, será necessário analisar um número maior de bebês.
Talvez a retenção de alumínio não seja tão grave no caso dos prematuros. Em um estudo com ratos recém-nascidos e adultos, Marlei Veiga, doutoranda no grupo de Denise, verificou que embora os filhotes tratados com nutrição parenteral apresentem altos teores de alumínio nos órgãos, eles conseguem eliminar melhor o contaminante do que os roedores mais velhos, talvez por terem um metabolismo mais rápido. Os resultados estão disponíveis desde julho deste ano no site da revista Journal of Inorganic Biochemistry. Mas Denise não está tranquila: “Os prematuros são uma população de risco”.
Hemodiálise
Já está bem comprovado, porém, que a toxicidade do alumínio está por trás de parte da mortalidade dos pacientes com problemas renais. Uma fonte importante de contaminação já foi a água, mas uma mudança de legislação alterou esse quadro no Brasil. Agora as embalagens são as vilãs da história. “Quanto mais nobre o vidro, mais alumínio ele contém.” As ampolas, por exemplo, são seladas a fogo, e só resistem às altas temperaturas por terem um alto teor de alumínio na sua composição. O problema é que algumas substâncias químicas reagem com o metal, como é o caso do citrato e do fosfato presentes na eritropoietina, um hormônio administrado a pacientes renais. Nesse caso a recomendação, de acordo com artigo publicado este ano na Renal Failure, é armazenar a eritropoietina na forma liofilizada: passados dois anos, a substância em pó continha menos alumínio do que aquela em solução.

No caso da nutrição parenteral, em cuja composição entram lipídios e açúcares, a substância problemática é o gluconato de cálcio, um açúcar. É ele que retira alumínio do vidro.
© LÉO RAMOS
Contamina_Pagina_04
Existem tentativas de regulamentar o teor máximo de alumínio em medicamentos. De acordo com a FDA, a alimentação parenteral de grande volume, armazenada em recipientes de 100 mililitros (mL) ou mais, não pode conter mais de 25  de alumínio por litro. Já as ampolas com 10 ou 20 mL do fármaco precisam indicar a quantidade máxima estimada para a data de validade do produto. O problema, Denise alerta, é que o alumínio é paulatinamente extraído e a quantidade vai aumentando. “A legislação não contempla o fenômeno que pode acontecer durante o tempo de armazenamento do produto.”

A solução para eliminar os potenciais efeitos nocivos da nutrição parenteral, segundo a química, seria armazenar o gluconato de cálcio em frascos de plástico. Ela imagina que seja essa a solução adotada no Reino Unido, onde em 2010 a agência responsável por regulamentar fármacos e equipamentos médicos, a Medicines and Healthcare products Regulatory Agency (MHRA), determinou que não se administre gluconato de cálcio armazenado em recipientes de vidro a menores de 18 anos e pacientes com insuficiência renal. “A mudança de procedimento foi baseada em nosso artigo de 2003”, conta Denise. Nesse trabalho, publicado na revista Journal of Trace Elements in Medicine and Biology, ela e colegas mostraram que o vidro é a fonte do alumínio na nutrição parenteral. “O que define o grau de contaminação são as propriedades químicas do produto. Quando a amostra é esterilizada, acelera o processo”, explica.
Denise passou os últimos anos embrenhada nessas questões, enquanto trabalhava no livro publicado este ano pela editora norte-americana Wiley: Sources of contamination in medicinal products and medical devices (Fontes de contaminação em produtos e equipamentos médicos). Na sua percepção, a indústria farmacêutica resiste à mudança de embalagem. “O gluconato de cálcio é um tipo de açúcar, e é mais difícil esterilizar a embalagem plástica e garantir que não haverá contaminação bacteriana.”
Mesmo assim, para a química gaúcha o conhecimento atual já é suficiente para propor mudanças no armazenamento de certos fármacos. Ao mesmo tempo, ela lembra que não é o caso de demonizar o metal: “Qualquer pão, qualquer queijo tem alumínio; é um componente comum em alimentos”. Não se assuste: o sistema digestivo absorve menos de 1% do alumínio ingerido, que é eliminado pelos rins. Denise lamenta que o conhecimento produzido no Brasil não tenha surtido  por aqui o efeito que teve no Reino Unido: ela não conseguiu chamar a atenção da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para o problema.
Artigos científicos
VEIGA, M. et al. Accumulation, elimination, and effects of parenteral exposure to aluminum in newborn and adult rats. Journal of Inorganic Biochemistry. On-line22 jul. 2013.

Fonte: Revista Fapesp - edição 212 - outubro de 2013
Por: Maria Guimarães


quinta-feira, 24 de outubro de 2013

XVI Congresso de Iniciação e Produção Científica e X Seminário PIBIC/UMESP de Pesquisa

Alunas da Biomedicina e Nutrição que fizeram Iniciação Científica no Centro de Neurociências marcaram presença no XVI Congresso de Iniciação e Produção Científica e X Seminário PIBIC/UMESP de Pesquisa da Universidade Metodista de SP.
Parabéns meninas!!!! Parabéns orientadores!!!!

 
 



terça-feira, 22 de outubro de 2013

Uma carona indesejada

Nanopartículas podem transportar moléculas intrusas para o interior das células
© LQES/UNICAMP
A área em amarelo indica a parte hidrofóbica da nanopartícula e a área em cinza indica a parte hidrofílica
A área em amarelo indica a parte hidrofóbica (avessa à água) da nanopartícula e a área em cinza a parte hidrofílica (com afinidades com água)
Ao analisar como nanopartículas porosas carregadas de fármacos interagiam com células tumorais, o químico Oswaldo Alves observou algo inesperado. Após vários experimentos, ele e sua equipe verificaram que, além do medicamento – a camptotecina, um antitumoral potente, mas de toxicidade elevada –, as nanoestruturas transportavam para dentro das células uma das moléculas do meio de cultura celular, a mistura de vitaminas, proteínas e sais minerais que mantém as células vivas. A descoberta sugeria que as nanopartículas não eram veículos tão eficientes quanto se acreditava para o transporte de medicamentos, e que poderiam até mesmo levar para dentro das células substâncias com efeitos nocivos. Em vez de auxiliares farmacológicos de alta precisão, seriam cavalos de Tróia.
Até agora, Alves e outros pesquisadores dessa área acreditavam que, encapsulados, os fármacos eram levados às células sem interferências externas. Isso porque essas nanocápsulas, feitas à base de sílica e com diâmetro de 20 a 60 nanômetros, são protegidas por uma capa formada por proteínas que ajuda a manter e proteger o medicamento no interior de seus poros. Agora, no estudo que rendeu para o grupo a capa da edição de julho da revista Applied Materials & Interface, os pesquisadores explicam que essas nanoestruturas também atraem moléculas avessas à água, desencadeando reações químicas que podem comprometer ou até mesmo bloquear a liberação do fármaco preso aos seus microporos.
“Essas interações comprometeriam a eficácia do experimento”, diz Alves em seu laboratório no Instituto de Química da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). “Podemos dizer, por exemplo, que é o fármaco que está agindo quando, na verdade, os resultados obtidos podem ser fruto da interação química entre o medicamento e as moléculas intrusas”, ele observa. “Se pensarmos esses fenômenos do ponto de vista clínico, sendo essas partículas injetadas no sangue, algumas das moléculas na corrente sanguínea poderiam atravessar essa barreira, sendo transportadas para dentro das células”. Os efeitos dessa interferência, segundo ele, podem acarretar na diminuição da quantidade de medicamento liberado. Em outras palavras, a quantidade de fármaco encapsulado pode não ser a mesma a chegar às células.
Até hoje, experimentos voltados à aplicação dessas nanoestruturas, de aspecto semelhante ao de uma bola de golfe, eram feitos normalmente em meios de culturas celulares sem considerar essas possíveis interações, segundo ele. “A verificação de que algumas moléculas conseguem furar a barreira protéica que recobre essas nanopartículas pode fazer com que muitos trabalhos já feitos tenham de ser revisados”, diz o biólogo Diego Stéfani Teodoro Martinez, do grupo de Alves.
© LQES/UNICAMP
microscopia de transmissão das nanopartículas de sílica multifuncionalizadas
Microscopia de transmissão das nanopartículas feitas à base de sílica multifuncionalizadas
Os pesquisadores ainda não sabem como se dá essa interação química. “Os componentes intrusos podem ser nocivos, mas não sabemos se isso pode acarretar numa associação cooperativa entre eles e o fármaco”, comenta Diego Stéfani. “Estamos diante de uma situação muito nova, que pode ter muitas implicações”. O mais importante, ele comenta, é que as moléculas intrusas, por conta própria, não pareciam ser capazes de penetrar nas células.
Uma hipótese levantada pelo grupo da Unicamp é que todo componente do meio de cultura celular com características hidrofóbicas (que repelem a água) possa ser atraído para o interior das nanopartículas. “Precisamos investigar melhor esse fenômeno. Não sabemos quanto do fármaco sai da partícula e quantos componentes são capazes de invadi-la. Só identificamos um deles, a SYTOX green”, diz o químico Amauri Jardim de Paula, autor principal do estudo. “O próximo passo é tentar controlar a quantidade de moléculas que entram na célula e entender se esse fenômeno ocorre de modo diferente em outros meios de cultura”.
Chegar a essas conclusões não foi fácil. Até concluir que nanoestruturas poderiam transportar para o interior das células outras substâncias além do fármaco, o grupo precisou percorrer um longo caminho envolvendo barreiras técnicas e burocráticas, incluindo a dificuldade de integrar pesquisadores de diferentes áreas – o estudo conta também com a colaboração do químico Nelson Durán, do Laboratório de Química Biológica da Unicamp, e dos biólogos Roberto Theodoro Araújo Júnior, Edgar Paredes-Gamero, Helena Nader e Giselle Justo, do Departamento de Bioquímica e de Ciências Biológicas da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).
Outro obstáculo foi fazer com que a camptotecina fosse encapsulada e transportada na quantidade necessária para o experimento. Assim como muitos fármacos, a camptotecina é uma substância insolúvel em água, o que dificulta a administração de suas doses. Em meados de 2012, Amauri, à época doutorando orientado por Alves, apresentou uma nova estratégia para tornar essas moléculas solúveis em água mais facilmente. Ele desenvolveu uma partícula de superfície hidrofílica (com afinidade com água), de modo que fosse solúvel, e interior hidrofóbico, de maneira que as características da nanopartícula fossem compatíveis com as características do antitumoral, insolúvel em água. Seu trabalho ganhou a capa da Journal of the Brazilian Chemical Society em outubro de 2012.
Amauri e Alves observaram que as nanopartículas à base de sílica, diferentemente do que se pensava, não destruíam as células vermelhas do sangue, as hemácias. “Colocadas no meio de cultura celular e em seguida revestidas por proteínas essas partículas se tornam aparentemente inofensivas para as hemácias”, explica Amauri, atualmente professor do Departamento de Física da Universidade Federal do Ceará (UFC). “Agora queremos saber se essas nanoestruturas feitas de sílica se acumulam no organismo ou são eliminadas. Há poucos estudos envolvendo os efeitos colaterais dessas nanoestruturas”.
No Instituto Butantan, e em outros centros de pesquisa, partículas de sílica têm sido a base para novas vacinas (ver Pesquisa FAPESP nº204). Em especial, um tipo de nanopartícula mesoporosa de sílica chamada de SBA-15 tem se mostrado eficiente no transporte de vacinas por via oral. No ano passado, testes conduzidos pelo instituto, em parceria com a Universidade de São Paulo e o Laboratório Cristália, contra a hepatite B em camundongos mostrou que essas partículas conseguem atravessar o ambiente ácido do estômago, sendo absorvidas pelo intestino, feito que a maioria das proteínas não é capaz de fazer.
O uso de nanopartículas para o transporte de fármacos tem sido estudado e desenvolvido em todo o mundo. Para o químico Henrique Eise Toma, da USP, o uso de nanopartículas mesoporosas é mesmo mais adequado para moléculas pequenas, que se alojam em suas cavidades ou poros. No estudo de Alves, ele explica, as nanopartículas atuam como liberadores ou carreadores de fármacos, mas nem sempre elas têm um alvo bem definido. “Nessa linha existem alternativas como a ciclodextrina, já incorporada na maioria dos fármacos”, comenta. Segundo ele, a linha de pesquisa mais “bonita”, de fato, é a funcionalização das nanopartículas para atingirem determinado alvo ou tipo de célula.
Ao contrário do transporte molecular, as nanopartículas normalmente não atravessam as membranas celulares. Contudo, algumas conseguem ser assimiladas pelas células, que as confundem com proteínas. Para o químico, estudos como os de Alves e seu grupo abrirão novas perspectivas em áreas como a da nanomedicina.
Projeto
Produção de nanoestruturas mesoporosas à base de sílica para o transporte de agentes antitumorais hidrofóbicos (nº 09/58917-3); Modalidade: Doutorado;Coord.: Amauri Jardim de Paula/Unicamp; Investimento: R$ 110.201,13 (FAPESP).

Artigos científicos
PAULA, A. J. et al. Influence of protein corona on the transport of molecules into cells by mesoporous sílica Nanoparticles. Applied Materials & Interfaces. v. 5, n.17, p. 8.387–93. 2013.

Fonte: Revista Fapesp, por Rodrigo de Oliveira - Edição online - outubro de 2013 

domingo, 20 de outubro de 2013

Seja bem-vindo à Metodista!

Existe um lugar no mundo no qual as pessoas passam os melhores anos da sua vida.
Um lugar que dá os alicerces necessários para a construção do futuro, que permite arriscar, aprender, crescer e vivenciar momentos inesquecíveis: a Universidade Metodista de São Paulo.
No mundo Metodista, o que faz a diferença é ser plural e sem fronteiras. Por isso, a Universidade oferece completa formação profissional e o contato com diferentes áreas de atuação, permitindo a exploração de múltiplos temas. Essa integração tem feito a diferença e contribuído para a consolidação de muitos talentos.
Acompanhe depoimentos e histórias de professores, alunos e ex-alunos e conheça os projetos da Universidade Metodista de São Paulo.
Seja bem-vindo à Metodista, um mundo de possibilidades e experiências.
Acesse nosso site: metodista.br | Vestibular: metodista.br/vestibular
Vídeo: http://vimeo.com/73398977
 

terça-feira, 15 de outubro de 2013

PARABÉNS PROFESSOR!

Uma homenagem do curso de Biomedicina Metodista 
aos professores, "aqueles que tem nas mãos, a única profissão que torna todas as outras possíveis"  !!!!


Ser professor é professar a fé e a certeza de
que tudo terá valido a pena se o aluno se sentir feliz
pelo que aprendeu com você e pelo que ele lhe ensinou...

Ser professor é consumir horas e horas pensando
em cada detalhe daquela aula que,
 mesmo ocorrendo
todos os dias, a cada dia é única e original...

Ser professor é entrar cansado numa sala de aula e,
diante da reação da turma, transformar o cansaço
numa aventura maravilhosa de ensinar e aprender...

Ser professor é importar-se com o outro numa
dimensão de quem cultiva uma planta muito rara que
necessita de atenção, amor e cuidado.

Ser professor é ter a capacidade de "sair de cena,
sem sair do espetáculo".
Ser professor é apontar caminhos, mas deixar que
o aluno caminhe com seus próprios pés...


Feliz dia dos Professores!

segunda-feira, 7 de outubro de 2013

Cemitérios como Fonte de Contaminação Ambiental: Infraestrutura superada dessas unidades pode afetar recursos hídricos e disseminar microrganismos ameaçadores para a saúde

Em razão do crescimento da população e contaminação das águas superficiais, o que compromete os padrões de potabilidade a custos razoáveis, o abastecimento de regiões quase sempre de maior densidade demográfica é um desafio crescente e de alto investimento, limitando a exploração de fontes hídricas subterrâneas.

O aumento populacional também exige áreas cada vez maiores para sepultamento de corpos humanos. Assim, áreas destinadas à implantação de cemitérios geralmente são escolhidas entre as de baixa valorização econômica, quase sempre em regiões de reduzido desenvolvimento socioeconômico. Essas áreas muitas vezes têm características geológicas e hidrogeológicas não avaliadas devidamente, o que pode levar a problemas sanitários e ambientais de enorme complexidade. Cemitérios são áreas que geram alterações no meio físico e por isso devem ser considerados fontes sérias de impacto ambiental.

No Brasil, a maioria dos cemitérios é muito antiga e, exatamente por isso, descompassados em termos de estudos técnicos e ambientais. Considerando essa situação, o Conselho Nacional do Meio Ambiente publicou, em 3 de abril de 2003, a Resolução nº 335 estabelecendo que todos os cemitérios horizontais e verticais deverão ser submetidos ao processo de licenciamento ambiental. Mas que impactos podem ser produzidos por cemitérios? 

Cemitério João Batista, em Fortaleza, Ceará, construído em 1866: exemplo de unidade sem infraestrutura necessária para impedir contaminação de água subterrânea.
CONTAMINAÇÃO DO SOLO

Os cemitérios, como qualquer outra instalação que afete as condições naturais do solo e das águas subterrâneas, são classificados como atividade com risco de contaminação ambiental. A razão disso é que o solo em que estão instalados funciona como um filtro das impurezas depositadas sobre ele. O processo de decomposição de corpos libera diversos metais que formam o organismo humano, sem falar nos diferentes utensílios que acompanham o corpo e o caixão em que ele é sepultado. O principal contaminante na decomposição dos corpos é um líquido conhecido como necrochorume, de aparência viscosa e coloração castanho-acinzentada, contendo aproximadamente 60% de água, 30% de sais minerais e 10% de substancias orgânicas degradáveis.

Em solos com alta umidade há um processo conhecido como saponificação pelo qual ocorre a quebra das gorduras corporais e a liberação de ácidos graxos. Esse composto liberado exibe alta acidez, o que inibe a ação de bactérias putrefativas, retardando assim o mecanismo de decomposição do cadáver e tornando o mecanismo tanto mais duradouro quanto mais contaminante.

Urnas funerárias confeccionadas em madeira estão fora das fontes signifi cativas de contaminação do solo, ao contrário do que ocorre com as metálicas. A menos que conservantes da madeira contenham metais pesados, principalmente cromo, ou substâncias do grupo dos organoclorados, como pentaclorofenol ou tribromofenol. Os caixões construídos com madeiras não tratadas se decompõem em curtos períodos, permitindo uma rápida disseminação de líquidos da putrefação dos corpos. Caixões de metal, pouco utilizados, no entanto, podem provocar contaminação do solo por metais como ferro, cobre, chumbo e zinco. Outra fonte significativa de impactos contaminantes por caixões funerários é a prata, com frequência utilizada nas alças. Na decomposição ela é liberada no ambiente.

Além dos metais convencionais, outro contaminante significativo é a radioatividade. Corpos que, antes da morte, ou mesmo depois dela, passaram por aparelhos com emissão de radiação podem estar contaminados. Nesse caso essa radioemissão também é liberada no solo.

Durante o processo de decomposição orgânica, além dos líquidos liberados há emissão também de alguns tipos de gases, entre eles principalmente os característicos da decomposição anaeróbica, como o gás sulfídrico (H2S), identifi cados popularmente como cheiro de “ovo podre”, incluindo dióxido de carbono, gás carbônico (CO2), metano (CH4), amônia (NH3) e hidrato de fósforo, a fosfina (PH3). Além desses elementos característicos, outros gases são emitidos, caso dos óxidos metálicos (titânio, cromo, cádmio, chumbo, ferro, manganês, mercúrio e níquel entre outros) lixiviados dos adereços das urnas mortuárias, incluindo formaldeído e metanol utilizados na prática do embalsamento.

CONTAMINAÇÃO DAS ÁGUAS

Memorial Necrópole Ecumênica de Santos: instalação vertical economiza espaço físico e concepção moderna impede contaminação ambiental típica de unidades tradicionais.
Como se não bastasse, a poluição atmosférica, pela liberação desses gases, e do solo, pelo desprendimento de resíduos já considerados, os cemitérios podem ainda trazer sérios problemas ambientais à qualidade da água, principalmente os estoques subterrâneas. A infiltração das águas de chuva nos túmulos promove o transporte de muitos compostos químicos (orgânicos e inorgânicos) para o solo, que, dependendo das características geológicas do terreno, podem alcançar o aquífero, contaminando-o. Para a minimização desse risco potencial é indispensável o monitoramento da qualidade da água nessas áreas.


Túmulos em ruínas, com rachaduras que permitem infiltração em especial das águas de chuva, problemas provocados pela compactação do solo por raízes de árvores de maior porte, além de negligência de proprietários de jazigos em cemitérios também favorecem de maneira específica a contaminação do lençol freático com impactos ambientais capazes de afetar a saúde pública.

O necrochorume, produzido no processo de decomposição orgânica, por exemplo, é liberado de forma constante por cadáveres em decomposição e apresenta um grau variado de patogenicidade. Grande parte dos organismos patogênicos não tolera a presença de oxigênio disponível na zona insaturada do solo e acaba eliminada. Mas a uma maior profundidade, nos aqüíferos por exemplo, a escassez de oxigênio permite abundante desenvolvimento de microrganismos. No caso de a captação de água para consumo humano ou animal ser feita a partir de poços com pequena profundidade, pessoas e animais que se servirem dela estão sob risco de doenças provocadas pela presença desses organismos.

Outra ameaça produzida por cemitérios é a ineficiente gestão de resíduos como as vestimentas que envolvem os corpos, incluindo restos de caixões. Esses resíduos geralmente são depositados nas proximidades das áreas de sepultamento e, em contato com a água da chuva, podem fazer com que diversas substâncias indesejáveis se infiltrem no solo e também atinjam as fontes hídricas.

DOENÇAS LIGADAS A CEMITÉRIOS

Diversos estudos de natureza ambiental associam áreas que abrigam cemitérios a aterros sanitários, considerando que em ambos estão disponíveis materiais orgânicos e inorgânicos com potencial contaminante. Mas, no caso de cemitérios, esses resíduos podem estar associados a um número ainda maior de patógenos, com potencial de levar à morte pessoas eventualmente contaminadas por eles.

Entre os riscos de degradação de fontes por cemitérios destacam-se os provocados por compostos nitrogenados. Com a decomposição dos corpos, substâncias nitrogenadas são liberadas pelo necrochorume. Esses compostos são responsáveis por doenças como a meta-hemoglobinemia, popularmente conhecida como “síndrome do bebê azul”. Essa doença está intimamente associada ao consumo de água com elevados teores de nitrato.

A polêmica em torno do potencial contaminante de cemitérios levou órgãos de vigilância e proteção ambiental a fiscalizar e multar cemitérios tanto públicos como privados que não se adequarem às novas normas da legislação. Áreas ocupadas por cemitérios exigem a necessidade de monitoramento contínuo do solo, águas, superficiais e subsuperfíciais, levando em conta que essas unidades são sempre fontes potenciais significativas de contaminação. Esses padrões estão contidos na Resolução do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama nº 335 de abril de 2003), onde constam informações necessárias para o licenciamento ambiental das áreas destinadas ao sepultamento de corpos humanos.

A partir da data de vigência dessa resolução órgãos ambientais estaduais e municipais passaram a ter obrigação de licenciar e fiscalizar a implantação de novos cemitérios. Já no caso de unidades mais antigas, foi homologada uma nova resolução do Conama (no 402/2008) que estabeleceu prazo máximo até dezembro de 2010 para definição de critérios de adequação das unidades disponíveis antes de 2003.

CREMAÇÃO

Cemitério público da cidade de Gravatá, em Pernambuco: sujo, parcialmente coberto pelo mato, com lixo e sepulturas violadas é um exemplo de necrópole que ameaça ambiente e saúde pública.
Da complexidade ambiental envolvendo os cemitérios, no entanto, emergem alternativas que acenam com menores impactos, como a prática de cremação. O costume de cremar os mortos tem origens tanto religiosas quanto de higiene ou até mesmo carência de espaços físicos. Nesse contexto entende-se por cremar o ato de reduzir o corpo a cinzas. Relatos históricos evidenciam que o ato de cremar os mortos era comum, por exemplo, na Grécia antiga, em especial como resultado de guerras, quando a maioria das vítimas fatais em batalhas passava por esse processo. Já os escandinavos adotaram essa prática por motivos religiosos. Para esses povos, apenas com a cremação a alma do morto estaria em liberdade.

A cremação não libera fumaça em seu processo. De modo geral, o procedimento ocorre a temperaturas de 900°C, com duração de duas horas e captura de gases liberados pela queima. Dessa forma, a cremação é a solução póstuma de menor impacto ambiental, pois não gera resíduos convencionais com potencial de contaminar o ambiente, tanto no solo quanto na atmosfera.

A prática de cremação tem vantagens também quanto à eliminação de microrganismos patogênicos que o sepultamento convencional apresenta. As elevadas temperaturas da cremação eliminam por completo essas fontes naturais de poluição. Assim, a cremação, acompanhada de rituais que também se manifestam em sepultamentos convencionais, é uma forma de garantia e segurança ambiental aos que continuam vivos.
Cemitérios verticais são uma alternativa a instalações convencionais sujeitas a todos os impactos ambientais considerados. Nessas unidades os corpos são depositados em instalações com finalidades específicas e geralmente se assemelham a edifícios comuns, como é o caso do Memorial de Santos, no litoral de São Paulo, que chega a 14 andares. Esse tipo de instalação tem diversas vantagens em relação ao cemitério horizontal, entre elas um número comparativamente reduzido de exigências legais.

Cemitérios verticais também oferecem a facilidade de menor espaço físico, ausência de interferência do necrochorume e resíduos nas águas subterrâneas, baixa exigência quanto ao tipo de solo, facilidade de sepultamento e visitas em dias chuvosos. Aqui, no entanto, há exigência de cuidados em relação à liberação de gás sem tratamento e atenção especial na construção para evitar vazamento de necrochorume e eventual emissão de odor. Quanto aos impactos provocados ao meio ambiente, destaca-se que nos cemitérios verticais também não há contato direto do corpo com o solo, diminuindo os riscos produzidos pela contaminação tanto do solo quanto dos recursos hídricos.

Os problemas relativos ao sepultamento convencional e portanto às áreas ocupadas por cemitérios se iniciaram com a comunidade cristã, na Idade Média, quando os corpos eram enterrados próximos às igrejas. Mas relatos e estudos mais avançados dessas áreas são recentes. É possível identifi car, na maioria dos cemitérios, desafios relacionados a planejamento, gestão, depósito inadequado de resíduos, entre outros desafi os técnicos que afetam tanto as unidades de propriedade pública quanto privadas.

FONTE: Scientific American
Por: Pedro Kemerich, Fernando Ernesto Ucker e Willian F. de Borba
Imagem: ©Bobby Haas/National Geographic Getty Images / ©cia de foto - editorial Latinstock

MIT convida para uma nova experiência ensinando princípios fundamentais da neurociência online

Discover what makes your brain tick in this first module of a three-part introductory series in neuroscience.

Manifesto
Let’s face it: MOOCs (Massive Open Online Courses) promise disruption, and yet most of them to date deliver an extremely traditional learning experience. Basically, it’s the big-lecture-hall format, with an internet-sized lecture hall.
However, many of us in higher education never were happy about the big-lecture-hall format in the first place. Lecturing to an audience of hundreds is a impersonal experience for all involved; the interaction is usually almost completely unidirectional, and the material must be lowered to the lowest common denominator. Make no mistake: there are many professors who are masters of this format, who can inspire mass audiences. However, I’d wager that most of them still wish they could engage with their students in a smaller format. The big-hall lecture is a practical necessity, but it is in no way ideal. In many ways, the big lecture is academia’s dirty laundry; many of the most memorable experiences in a Harvard education come from smaller seminar experiences, not to mention interactions with peers.
Our goal is to reboot the MOOC and leverage the advantages of the internet, rather than just shoveling the same old lecture format onto the web. It’s going to be a long journey, and we’re almost certainly not going to get it right the first time, but we’re excited about the possibilities. We invite you to join us in this experiment and we welcome your feedback and help in making an online learning space that lives up to the hype.

ABOUT THIS COURSE:
MCB80x: Fundamentals of Neuroscience is a three part course that explores the structure and function of the nervous system — from the microscopic inner workings of a single nerve cell, to the staggering complexity of the brain, and beyond to the social interactions and societal dynamics that our brains make possible. We’ll take a look at how our nervous system enables every part of human experience — our senses, movement, personality, emotion — and how drugs and disease can alter and disrupt normal function.
In this first module (MCB80.1x) we’ll look at how individual neurons use electricity to transmit information. We’ll invite you to build up a neuron, piece by piece, using interactive simulations, and we’ll take you on field trips in and around Harvard and Boston, bring you into the lab, and show you how to conduct DIY neuroscience experiments on your own.

CLASSES START:
October 31th, 2013.

WEBSITE:
http://www.mcb80x.org/

Massive Open Online Course: Fundamentals of Neuroscience, MIT.
Fundamentals of Neuroscience, Part I

Dois americanos e um alemão levam o Nobel de Medicina de 2013

Pesquisadores investigaram o transporte vesicular, um processo celular. Trabalhos detalharam funcionamento da 'fábrica celular' de moléculas.

Os vencedores do Nobel de Medicina deste ano,  Randy Schekman, Thomas Südhof e  James Rothman (Foto: Peg Skorpinski/Reuters;  Mary Altaffer/AP; Yale University/AP)
 
O Prêmio Nobel de Fisiologia ou Medicina de 2013 foi oferecido nesta segunda-feira (7) pelo Instituto Karolinska, em Estocolmo, aos pesquisadores James Rothman, Randy Schekman e Thomas Südhof, por seus trabalhos sobre o transporte vesicular, um importante processo celular.
Segundo os membros do comitê que concede o prêmio, o entendimento do transporte vesicular foi importante para compreender melhor doenças como tétano e diabetes, entre outras.
Os representantes ainda explicaram que as pesquisas dos vencedores deste ano não levaram ainda à criação de alguma medicação, mas ajudaram a avançar a eficiência de diagnósticos de diversas doenças.
O prêmio em dinheiro é de 8 milhões de coroas suecas (US$ 1,3 milhão), a mesma quantidade que no ano passado, mas 20% menos que em 2011.
 
Entenda
Cada célula funciona como uma “fábrica” que produz e exporta moléculas. A insulina, por exemplo, é produzida e secretada para o sangue, e neurotransmissores, que funcionam como sinais químicos, são mandados de uma célula nervosa para outra. Essas moléculas são transportadas em pequenos “pacotes” chamados vesículas.
Os ganhadores do Nobel deste ano descobriram os princípios moleculares que regulam como essas cargas chegam no momento certo e no lugar certo dentro de cada célula.
O Instituto Karolinska considera que o trio, cujos trabalhos foram publicados entre a segunda metade da década de 1970 e o começo da década de 1990, descobriu um processo fundamental na fisiologia celular.
O transporte e a fusão vesicular funcionam pelos mesmos princípios gerais em organismos tão diferentes quanto fungos e seres humanos.
Processos como a sinalização para o cérebro de que ele precisa liberar hormônios ou substâncias imunológicas, dependem do transporte vesicular. Sem esse mecanismo funcionando precisamente, as células entram num estado caótico.
Randy Schekman descobriu um conjunto de genes importantes para o transporte vesicular. James Rothman destrinchou o “maquinário” de proteínas que permite às vesículas se fundirem com suas cargas, fazendo com que sejam transportadas. Já Thomas Südhof revelou como funcionam os sinais que instruem as vesículas a soltarem suas cargas com precisão.
Rothman nasceu em 1950 nos EUA e trabalha na Universidade Yale. Shekman nasceu em 1948, também nos Estados Unidos, e fez suas pesquisas na Universidade da Califórnia, em Berkeley. Thomas Südhof nasceu em 1955 na Alemanha, mas também atua na Califórnia, na Universidade Stanford.
Info Nobel Medicina 2013 v2 (Foto: Editoria de Arte/G1)
 
 
Nobel de Medicina
O Nobel de Medicina é oferecido desde 1901 e já reconheceu o trabalho de 204 pessoas – 194 homens e 10 mulheres. A média de idade dos cientistas na data do anúncio era de 57 anos, e não há premiações póstumas.
O pesquisador mais novo a receber esse Nobel foi Frederick G. Banting, que tinha 32 anos em 1923, pela descoberta da insulina.
Por nove vezes, o prêmio – que ganhou esse nome em homenagem ao inventor da dinamite, Alfred Nobel – não foi anunciado: em 1915, 1916, 1917, 1918, 1921, 1925, 1940, 1941 e 1942.
Medicina é sempre a primeira área valorizada com o Nobel a cada ano.
Nesta terça-feira (8), será anunciado o de Física, na quarta (9) o de Química, na quinta (10) o de Literatura, e na sexta (11) o da Paz. O de Economia será anunciado na segunda-feira da próxima semana (14).
Os vencedores são geralmente informados pelo júri no dia do anúncio oficial e não há uma lista de concorrentes disponível previamente, o que torna a divulgação sempre uma surpresa – embora haja favoritos.
 
Veja os últimos ganhadores do Nobel de Medicina
 
2012: Shinya Yamanaka (Japão) e John B. Gurdon (Grã-Bretanha), por trabalhos com células-tronco
2011: Bruce Beutler (EUA), Jules Hoffmann (França) e Ralph Steinman (Canadá), por descobertas sobre o sistema de defesa do corpo humano
2010: Robert Edwards (Grã-Bretanha), pelo desenvolvimento da fertilização in vitro
2009: Elizabeth Blackburn (Austrália-EUA), Carol Greider e Jack Szostak (EUA), pela descoberta de uma enzima que protege as extremidades dos cromossomos
2008: Harald zur Hausen (Alemanha), pela descoberta do vírus do papiloma humano (HPV), causador do câncer de colo do útero; Françoise Barré-Sinoussi e Luc Montagnier (França), por descobertas sobre o vírus da imunodeficiência humana (HIV), que causa a Aids
2007: Mario Capecchi (EUA), Oliver Smithies (EUA) e Martin Evans (Grã-Bretanha), por trabalhos com células-tronco e manipulação genética em modelos animais
2006: Andrew Z. Fire (EUA) e Craig C. Mello (EUA), pela descoberta da ribointerferência, um mecanismo exercido por moléculas de RNA
2005: Barry J. Marshall (Austrália) e J. Robin Warren (Austrália), pela dascoberta da bactéria Helicobacter pylori e seu papel na gastrite e úlcera estomacal
2004: Richard Axel (EUA) e Linda B. Buck (EUA), por descobrir os receptores de cheiro e a organização do sistema olfativo
2003: Paul C. Lauterbur (EUA) e Peter Mansfield (Grã-Bretanha), pela invenção da ressonância magnética nuclear
 
O alemão Thomas Südhof em foto da Universidade Stanford (Foto: Steve Fisch/Universidade Stanford/Reuters)       O alemão Thomas Südhof em foto da Universidade Stanford (Foto: Steve Fisch/Universidade Stanford/Reuters)
O professor Schekman em sua casa na Califórnia, nesta segunda (7) (Foto: Robert Galbraith/Reuters)      O professor Schekman em sua casa na Califórnia, nesta segunda (7) (Foto: Robert Galbraith/Reuters)
 
Fonte: G1 - 07/10/2013

domingo, 6 de outubro de 2013

Por que ser cientista?

Essa é uma pergunta que escuto frequentemente, quando converso com jovens ainda indecisos com relação a qual carreira seguir. Na verdade, o que vejo, e tenho certeza que meus colegas confirmam isso, é que a maioria absoluta dos jovens não tem a menor ideia do que significa ser um cientista ou como se constitui a carreira. Imagino que nem 5% da população brasileira possa mencionar o nome de três (ou um?) cientista brasileiro da atualidade. A questão não é essa constatação, que é óbvia, mas o que podemos fazer para mudar isso.
O primeiro obstáculo é o da invisibilidade. Se ninguém conhece um cientista, fora o que se vê na TV ou no cinema, fica difícil contemplar a possibilidade de uma carreira em ciências. Contraste isso com médicos, dentistas, professores, policiais, profissões que fazem parte da vida dos jovens. Quando um jovem imagina um cientista, provavelmente pensa no programa de TV "The Big Bang Theory", ou em uma foto do Einstein de língua de fora.
A solução é maior visibilidade: é ter cientistas visitando escolas públicas e particulares, incluindo estudantes de pós-graduação que, na maioria absoluta, têm uma bolsa de estudos do governo. Proponho que, como parte da bolsa, estudantes de mestrado e doutorado devam fazer uma visita ao ano (ou mais se desejarem) a uma escola local para conversar com as crianças sobre o seu trabalho de pesquisa e planos para suas carreiras. Sugiro que seus orientadores façam o mesmo.
Sim, eu faço isso com muita frequência, tanto no Brasil quanto nos EUA. Pelo menos uma visita ou palestra (às vezes via Skype) por mês. Não tira pedaço e é extremamente útil e gratificante.
O segundo obstáculo é o estigma de nerd. Cientista é o cara bobão, o que não tem nenhum amigo e por isso vira CDF. Grande bobagem. Tem cientista de todo jeito, e alguns são nerds, como são alguns médicos, dentistas e policiais, e outros são "supercool", com suas motocicletas, pranchas de surfe e sintetizadores. Tem nerd que é "cool". Tem cientista ateu e religioso, flamenguista e corintiano, conservador e comunista. A comunidade é tão variada quanto em qualquer outra profissão.
O terceiro obstáculo é o da motivação. Por que fazer ciência? Esse é o mais importante deles, e o que requer mais cuidado. A primeira razão para se fazer ciência é ter uma paixão declarada pela natureza, um desejo insaciável de desbravar os mistérios do mundo natural. Essa visão, sem dúvida romântica, é essencial para muita gente: fazemos ciência porque nenhuma outra profissão nos permite dedicar a vida a entender como funciona o mundo e como nós humanos nos encaixamos no grande esquema cósmico. Mesmo que o que cada um pode contribuir seja, na maioria dos casos, pouco, é o fazer parte desse processo de busca que nos leva em frente.
Existe também o lado útil da ciência, ligado diretamente a aplicações tecnológicas, em que novos materiais e novas tecnologias são postos a serviço da criação de produtos e da melhoria da qualidade de vida das pessoas. Mas dado que a preparação para a carreira é longa --depois da graduação ainda tem a pós com bolsas bem baixas-- sem a paixão fica difícil ver a utilidade da ciência como a única motivação. No meu caso, digo que faço ciência porque não me consigo imaginar fazendo outra coisa que me faça tão feliz. Mesmo com todas as barreiras da profissão, considero um privilégio poder pensar sobre o mundo. E poder dividir com os outros o que vou aprendendo no caminho.
 
Marcelo Gleiser é professor de física e astronomia do Dartmouth College, em Hanover (EUA). É vencedor de dois prêmios Jabuti e autor, mais recentemente, de "Criação Imperfeita". Escreve aos domingos na versão impressa de "Ciência".
 
Fonte: Folha de SP - on line - 06/10/2013

sábado, 5 de outubro de 2013

Danos da radioatividade: Tecidos animais de antigos experimentos podem ajudar a compreender níveis de radiação prejudiciais

A cidade de Ozersk, nos Urais do Sul, na Rússia, esconde relíquias de um massivo experimento secreto. Do início dos anos 50 até o fim da Guerra Fria, cerca de 250 mil animais foram sistematicamente irradiados. Algumas doses eram altas o bastante para matar instantaneamente; outras eram tão baixas que pareciam inofensivas. Depois que animais  como camundongos, ratos, cães, porcos e macacos morriam, os cientistas dissecavam os tecidos para observar os danos que a radioatividade havia provocado. Temendo um ataque nuclear por parte dos Estados Unidos, a União Soviética queria entender como a radiação danifica tecidos e produz doenças como o câncer. Preocupações com acidentes locais como o desastre de 1957 na usina nuclear Mayak, perto de Ozersk, eram outra motivação. Amostras semelhantes de tecidos irradiados foram feitas nos Estados Unidos, Europa e no Japão, onde quase meio bilhão de animais foi sacrificado com esse fim. Com o fim da Guerra Fria essas coleções foram abandonadas.

Agora essas amostras se tornaram importantes para uma nova geração de radiobiólogos, que querem explorar os efeitos de doses extremamente baixas de radiação – abaixo de 100 milisieverts (mSv – unidade de medida que avalia os efeitos da radiação absorvida pelo organismo) –, normalmente utilizadas em procedimentos médicos como diagnósticos por tomografia computadorizada. Outro interesse dos pesquisadores é analisar os riscos aos quais as pessoas que vivem perto dos reatores nucleares danificados de Fukushima, no Japão, estão expostas.

As velhas coleções fornecem um recurso que não poderia ser recriado hoje. A maioria dos experimentos foi feita sob condições precisas, com várias de doses de radiação e geralmente por toda a vida dos animais. “Nós nunca conseguiremos repetir a escala desses experimentos, por razões éticas e de financiamento”, observa Gayle Woloschak, radiobiólogo da Northwestern University, em Illinois. “Mas talvez possamos reutilizar os tecidos restantes”, completa.

Nos últimos anos, pesquisadores do mundo todo organizaram um movimento para identificar e resgatar tecidos dos maiores experimentos de irradiação animal e receberam suporte de diversos tipos de agências de financiamento, incluindo a Comissão Européia, o Instituto Nacional do Câncer e o Departamento de Energia dos Estados Unidos.

Ainda assim, os desafios são grandes. Os pesquisadores devem mostrar que a idade das amostras e as técnicas de preservação usadas não afetaram o DNA, o RNA e as proteínas. Além disso, eles têm que juntar esses dados moleculares para revelar se os circuitos celulares são destruídos em baixas doses de radiação. Testes iniciais indicam que algumas das amostras serão utilizáveis.

Reservatórios de radiação

Quando os sobreviventes das bombas nucleares de Hiroshima e Nagasaki e os trabalhadores contaminados de Mayak começaram a desenvolver doenças cardiovasculares a taxas acima do normal, ficou claro que a radiação faz mais do que “apenas” provocar câncer. O que não se sabe é se – e como – doses muito baixas de radiação podem aumentar riscos à saúde. Os biólogos geralmente supõem que o dano será proporcional à dose, mas estudos in vitro mostraram que as células conseguem restaurar danos modestos no DNA prouzidas por radiação – e que baixas doses de radiação podem até mesmo proteger o organismo contra exposições futuras.

“Talvez haja um limiar abaixo do que a radiação não seja nociva”, observa Wolfgang Weiss, diretor de proteção e saúde radioativa no Escritório Federal para Proteção contra Radiação da Alemanha, em Munique. Estudos epidemiológicos em pessoas expostas à radiação não trouxeram maiores explicações sobre o assunto. Algumas das pesquisas tinham um número muito baixo de pessoas estudadas para detectar o que poderia ser um pequeno aumento na incidência da doença; em outras não ficou claro qual a dose recebida. Assim, ainda que agências de proteção radioativa normalmente limitem a exposição ocupacional (na indústria nuclear, por exemplo) a uma média de 20 mSv por ano, os cientistas não têm dados adequados para afirmarem qual nível de radiação, se é que existe algum, é realmente seguro.

Em fevereiro de 2007, a busca para encontrar esses tecidos levou Soile Tapio a um dos antigos centros de pesquisa nuclear da Alemanha, o Helmholtz Centre Munich. Soile estava participando do programa “Promoção dos Arquivos Europeus de Radiobiologia” (ERA-PRO, em inglês), parte de um esforço desde 1996 para digitalizar os dados dos experimentos com radiação feitos na Europa. Em 2006, o diretor do programa de irradiação animal do Instituto Biofísico dos Urais do Sul (Subi), em Ozersk, alertou Soile sobre os diversos foco dos estudos que ocorriam ali. Ela não sabia exatamente o que esperar quando se pôs a caminho com sua pequena delegação da ERA-PRO.

Proibido

Alguns meses foram necessários para receber a aprovação da Rússia para visitar a cidade fechada de Ozersk. Depois de um longo voo, uma viagem de carro de três horas e uma demorada autorização de segurança, um pequeno grupo de cientistas idosos levou a equipe até uma casa abandonada com furos no teto e janelas quebradas. Lâminas de vidro e cadernos de laboratório jaziam espalhados pelo chão de algumas salas. Mas outras, aquecidas, continham caixas de madeira com lâminas e blocos de cera em sacos plásticos. Em seus tempos de glória o programa tinha mais de 100 funcionários. Quando foi abruptamente fechado durante a Guerra Fria, apenas quatro ou cinco pessoas foram incumbidas de cuidar do material produzido. Os visitantes ficaram impressionados ao descobrir que esses cientistas podiam ligar todas as amostras, de 23 mil animais, a protocolos detalhados de experimentos individuais. “Os cientistas ficaram muito felizes com o fato de alguém finalmente reparar nas coleções”, descreve Soile. “Eles me disseram várias vezes que queriam deixá-las em ordem antes de morrer”.
Enquanto isso, outra operação de resgate de tecidos estava sendo feita nos Estados Unidos. Na metade da década de 90, Gayle trabalhou nas amostras de 7 mil cães (beagles) e 50 mil ratos que haviam sido irradiados em experimentos no Laboratório de Pesquisa Argonne, em Illinois, entre 1969 e 1992. Depois de se mudar para a Northwestern, ela descobriu que as amostras estavam sendo jogadas fora e conseguiu permissão do Departamento de Energia para armazená-las.
A Northwestern University atualmente é o lar de materiais provenientes de todos os estudos sobre irradiação animal dos Estados Unidos e Gayle estima que já recebeu 20 mil amostras. Ela descobriu também que muitos  tecidos já foram destruídos, incluindo os de estudos feitos com ratos, no Laboratório Nacional Oak Ridge, no Tennessee, e os realizados com cães, na University of California. Coleções também foram destruídas em outros locais, incluindo os feitos pela Universidade de Hiroshima, no Japão, pela Agência Nacional de Novas Tecnologias, Energia e Desenvolvimento Econômico Sustentável em Casaccia, na Itália, e no complexo do Conselho de Pesquisas Médicas do Reino Unido.

Os cientistas sabem que colocar as mãos nos antigos tecidos será apenas o primeiro desafio: depois disso eles precisam descobrir se as biomoléculas dos materiais ainda podem ser detectadas e medidas. Eles querem identificar e analisar as rotas moleculares atingidas por pequenas doses de radiação para ver como as células de diferentes tecidos se adaptam – ou não – ao estresse, e como isso pode colocá-las no caminho das doenças. Eles também querem descobrir os padrões de moléculas podem ajudar a determinar quanta radiação uma pessoa recebeu ou por que ela é particularmente suscetível a doenças induzidas por radiação.
O trabalho de Gayle, feito em 1990 no velho laboratório Argonne, traz alguma esperança. Ela descobriu, por exemplo, que ao usar a técnica de reação em cadeia de polimerase ela poderia detectar mutações ou reorganizações em genes específicos. Soile, enquanto isso, adaptou técnicas proteômicas padrão de modo que pudessem ser aplicadas a alguns dos tecidos mais velhos. Além disso, vários grupos estão estudando se micro-RNAs – que ajudam a controlar a expressão de genes e são relativamente estáveis – estão presentes nas amostras.

Os cientistas agora estão prontos para aplicar esse trabalho sistematicamente aos tecidos restantes: Soile está prestes a começar a trabalhar com tecidos cardíacos aplicados em parafina dos antigos estudos russos e americanos. Ela quer identificar quaisquer sinais de danos que possam explicar a elevada incidência de doenças cardiovasculares em sobreviventes de bombas nucleares. “Os cientistas que fizeram essas pesquisas procuravam câncer, mas podemos buscar outras doenças que sabemos ser relevantes”, ressalta ela.

Os estudos podem, no entanto, identificar outras respostas moleculares. “A resposta das células ao estresse causado por qualquer dose de radiação é uma rede complexa de atividades que provavelmente afeta muitas rotas moleculares”, explica Soile. Os radiobiólogos esperam que o limiar da dose “segura” varie entre tecidos e espécimes diferentes.

De qualquer forma, os tecidos em Ozersk foram colocados em ordem, como esperavam seus antigos guardiões. Eles logo se mudarão para um prédio de armazenamento de última geração que está sendo construído no campus Subi, junto com tecidos humanos dos trabalhadores de Mayak expostos a radiação. Os tecidos animais, esperam os pesquisadores, passarão por uma nova fase – dessa vez em palco internacional.

Fonte: Scientific American
Por: Alison Abbott       Imagem: ©Iaroslav Neliubov/ Shutterstock