Colaboradores

quinta-feira, 29 de março de 2012

Avanços contra o Alzheimer

Medicamento para tratar diabetes é a nova promessa para prevenir e até reverter os danos causados pela doença que afeta a memória.

Por: RICARDO ZORZETTO Edição Revista Fapesp Online março de 2012

Há uma notícia promissora para quem sofre da doença de Alzheimer. Uma série de experimentos conduzidos por uma equipe internacional coordenada pelos neurocientistas Fernanda De Felice e Sergio Ferreira, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), indica que uma medicação
aprovada em 2005 para tratar o diabetes tipo 2 parece deter e até reverter o avanço do Alzheimer. Descrita há pouco mais de um século pelo patologista alemão Alois Alzheimer, essa enfermidade neurodegenerativa é a mais comum entre os idosos – atinge 36 milhões de pessoas no mundo – e permanece sem cura. As medicações atualmente utilizadas apenas amenizam os sintomas, que se agravam com a evolução da doença.
Em um artigo publicado em 23/3 no Journal of Clinical Investigation, o grupo de Fernanda demonstrou que o medicamento exenatida-4 exerce um efeito protetor sobre os neurônios, as células cerebrais responsáveis pelo transporte e pelo armazenamento de informações, em geral
danificadas no Alzheimer. Administrada a camundongos geneticamente alterados para apresentar os efeitos típicos da doença neurodegenerativa, a exenatida reverteu os danos no cérebro e melhorou a memória dos roedores. Resultados semelhantes estão sendo observados nos experimentos ainda em andamento com macacos cinomolgos, realizados no laboratório de Douglas Munoz na Queen’s University, no Canadá, um dos colaboradores de Fernanda.
Esses resultados, apesar de animadores, devem ser vistos com cautela. Por ora, o efeito neuroprotetor foi demonstrado apenas em animais e em células cerebrais cultivadas em laboratório. Ainda será preciso aguardar os testes com seres humanos – já em andamento no Reino Unido, iniciados por um colaborador do grupo – antes que se possa propor o uso dessa
medicação também para o combate ao Alzheimer. “Somos muito cautelosos”, diz Fernanda. “Mas acredito que tenhamos novos resultados em mais um ou dois anos.” A maioria das pessoas pode estranhar a ideia de usar uma medicação contra o diabetes, que atinge tecidos e órgãos ditos
periféricos, para combater uma enfermidade que afeta o cérebro, no sistema nervoso central. Mas estudos feitos no Brasil e no exterior na última década tornam cada vez mais evidente que as duas enfermidades compartilham um mecanismo bioquímico comum.
Anos atrás o grupo do Laboratório de Doenças Neurodegenerativas da UFRJ, coordenado por Fernanda e Ferreira, seu marido, demonstrou haver um elo em comum entre diabetes e Alzheimer: o aproveitamento inadequado da insulina, hormônio produzido pelo pâncreas. Na maioria dos tecidos do corpo, a insulina ajuda as células a extrair do sangue a glicose (um tipo de açúcar) e a convertê-la em energia. No cérebro, porém, sua ação é diferente. Ao aderir a uma proteína da superfície dos neurônios, a insulina desencadeia as reações químicas que levam à aquisição e à consolidação da memória.
No trabalho do Journal of Clinical Investigation, os pesquisadores explicam agora como a incapacidade de usar a insulina – fenômeno chamado resistência à insulina – se instala no cérebro. Assim como no diabetes, a resistência à insulina surge no Alzheimer como consequência de uma inflamação. Testes com células e com camundongos, feitos pelas pesquisadoras Theresa Bomfim e Leticia Forny-Germano, e com cinomolgos, realizados por Jordano Brito-Moreira, demonstraram que pequenos aglomerados de um peptídeo – os oligômeros beta-amiloide, formados nos estágios iniciais do Alzheimer – estimulam a produção de uma molécula sinalizadora da inflamação que bloqueia o efeito da insulina. “A insulina se conecta ao receptor na superfície dos neurônios, mas a informação que ela emite não segue adiante”, explica Fernanda.
Ela ainda não sabe como o beta-amiloide estimula a produção de moléculas inflamatórias. Mas tanto seu grupo e como o de Konrad
Talbot, da Universidade da Pensilvânia, que também publicou um artigo no dia
23/3 no Journal of Clinical Investigation, já observaram que essas
mesmas moléculas se encontram em níveis muito mais elevados no cérebro de
pessoas com Alzheimer do que no daquelas sem a doença. Com a exenatida,
Fernanda e sua equipe conseguiram restituir a sinalização da insulina nos
neurônios. “Queríamos fazer um trabalho que tivesse a possibilidade de se
transformar rapidamente em uma aplicação clínica para essa doença devastadora”,
conclui.

sexta-feira, 16 de março de 2012

O que é, o que é? - Neurônios-espelho

Um neurônio-espelho, uma das descobertas mais importantes da neurociência na última década, está ligado à visão e ao movimento. Permite o aprendizado por imitação, já que 
é acionado quando é necessário observar 
ou reproduzir o comportamento de outros 
seres da mesma espécie. Por essa razão, acredita-se, é a base das habilidades sociais dos primatas. “Um neurônio-espelho pode 
ser usado para analisar cenas ou intenções de outros indivíduos”, comenta o neurocientista Stevens Rehen, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
O neurônio-espelho foi descrito inicialmente em macacos por pesquisadores da Universidade de Parma, na Itália, em 2004. “Técnicas de neuroimagem sugerem 
a existência de células com as
mesmas características no cérebro de humanos”, diz Rehen. Cogita-se, porém, que não seja um privilégio de primatas e possa ser encontrado também em outros animais, como as aves.
Sua localização já está definida – no córtex pré-motor e lobo parietal inferior dos primatas –, mas
ainda há dúvidas sobre o alcance de suas funções. Estudos recentes indicam que 
o neurônio-espelho está ligado à observação 
e imitação das expressões faciais e dos movimentos das mãos e, num estágio seguinte, dos próprios movimentos. O estudo das propriedades dessas células tem ajudado 
a entender a origem de alguns distúrbios neurológicos. O autismo, por exemplo, poderia resultar de disfunções dos neurônios-espelho.
Stevens Rehen, Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)
Fonte: Pesquisa Fapesp – edição on line
Imagem: Daniel Bueno